Litoral

Foco solidário

Escrito por Luisa Nucada

Em meio à epidemia de dengue em Paranaguá, que pode ter alcançado 8 mil casos confirmados, segundo estimativa da prefeitura, um exemplo de solidariedade. Motoclubes da região estão engajados em recolher doações de suprimentos para as centenas de pacientes que aguardam ser atendidos na única Unidade de Pronto Atendimento 24 horas (UPA) da cidade.

André e Amábile: pandemia. Fotos: Felipe Rosa.
André e Amábile: pandemia. Fotos: Felipe Rosa.

Debaixo de uma tenda montada em frente à UPA, de 800 a mil pessoas esperavam ser chamadas, sob forte calor e sem nenhuma assistência, todos os dias. ‘O povo não tinha nem água, e a hidratação é a medida mais importante para quem está com suspeita de dengue. De noite, não tinha iluminação na tenda, eles ficavam no escuro. Fomos nós que colocamos as lâmpadas e trouxemos mais cadeiras‘, conta o eletricista autônomo Leverson Capeta, 38 anos, o Nenê, membro do motoclube Cavalo de Aço.

Inspirado pelo pintor industrial Wallace Henrique Garcia Domingues, 35, que tirou dinheiro do bolso para comprar 50 pãezinhos e um galão de água para o povo, Nenê convocou seus colegas de motoclubes e organizou uma força-tarefa para fornecer assistência mínima aos pacientes, há uma semana. Os motoqueiros recorreram a comerciantes e moradores, pedindo doações de água mineral, suco e bolacha de água e sal, que passaram a distribuir aos pacientes.

Foto: Felipe Rosa
Força-tarefa fornece água, suco e bolacha a quem aguarda atendimento na tenda em frente à UPA. Foto: Felipe Rosa

Quando chove – quase todo final de tarde – quem aguarda fica espremido sob a tenda para não se molhar, e o local logo fica rodeado de lama. ‘Se está lotado, o tempo mínimo de espera é de cinco horas. Eu via parentes meus nessa situação, não podia ficar de braços cruzados. Mas o poder público deveria estar fazendo isso, não nós‘, diz Nenê. Segundo ele, o objetivo é chamar a atenção para a gravidade da epidemia, segundo ele, muito maior do que está sendo divulgado.

Casal dengoso

Na última sexta-feira (29), o casal de fotógrafos André Alexandre Alves, 44, e Amábile Tramontini Alves, 37, saía da UPA com uma má notícia: ele está com dengue. Abatido e com o rosto avermelhado, André relatou sentir dor intensa nas articulações, febre alta que não baixava, além de cansaço inexplicável. Há três semanas, era ela a doente. ‘Em dez dias passou, mas durante cinco dias fiquei bem mal‘, contou Amábile.

Por mais que tomasse todos os cuidados, como uso de repelente e inseticida, eles foram infectados. Só em seu círculo social, são 15 pessoas com a doença. ‘Mas se forçar a cabeça a gente lembra de mais‘, acrescenta ela. Em março de 2015, André teve zika. ‘Isso aqui já virou pandemia. Com tanto mosquito, não tem como escapar‘, diz a esposa.

Epidemia

Uma enfermeira voluntária que trabalha na tenda de triagem próxima à UPA afirmou que a epidemia de dengue na cidade ainda está em curva ascendente, ou seja, deve haver mais infectados antes que o número de casos se estabilize e comece a cair. ‘Aqui os ovos do mosquito estão eclodindo em três dias‘, disse ela, que preferiu não se identificar. O curto prazo para eclosão dos ovos mostra que Paranaguá tem condições favoráveis à reprodução do mosquito.

Segundo os números oficiais do boletim mais recente da Secretaria Estadual de Saúde (Sesa), havia 766 casos confirmados até a última terça-feira (26). Porém, o prefeito Edison Kersten (PMDB) admitiu, em coletiva de imprensa, que a cidade pode somar 8 mil casos, estimativa feita de acordo com orientação do Ministério da Saúde, que estipula haver até 10 casos não notificados para cada caso confirmado. Kersten pediu ajuda ao Exército Brasileiro para tentar conter o avanço da doença. Já são quatro as mortes causadas pela doença somente neste ano em Paranaguá.

Secretaria municipal tem um computador para enviar dados ao Estado.  Foto: Felipe Rosa.
Secretaria municipal tem um computador para enviar dados ao Estado.
Foto: Felipe Rosa.

Subnotificação

Vários fatores explicam a subnotificação de casos de dengue. Segundo a bioquímica e responsável técnica pelo laboratório da Secretaria Municipal de Saúde (Semsa), Fernanda Carvalho, muitas pessoas têm dengue e nem ficam sabendo, porque há casos assintomáticos. Existe também a questão do falso negativo. ‘Se o teste rápido é feito no primeiro ou segundo dia de sintoma, pode ser que não detecte. O ideal é que seja feito no terceiro dia‘, explica. Segundo ela, o número de hemogramas realizados pelo laboratório subiu quatro vezes em relação a esse mesmo período de anos anteriores. De sua equipe de 12 pessoas, três já ficaram doentes.

De acordo com a assessoria de comunicação da prefeitura, os hospitais e clínica particulares não estão comunicando os casos confirmados da doença à Vigilância Sanitária, mais uma razão para haver subnotificação. Segundo um médico envolvido no atendimento à dengue no município, a Semsa tem apenas um computador, onde se revezam três pessoas, para registrar os casos confirmados da doença e repassá-los à Sesa.

Investimentos

A Sesa destinou R$ 3,9 milhões para contratação de profissionais de saúde e insumos para a prefeitura de Paranaguá, que recebeu outros R$ 4 milhões enviados pela Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina (Appa) para limpeza pública. Os profissionais de saúde devem começar a trabalhar hoje.

Sobre o autor

Luisa Nucada

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