O homem de ferro de Curitiba tem 34 anos, é geólogo e apesar de ter um sorriso pelo qual é difícil não se afeiçoar, raramente é visto pedindo ajuda. Ele prefere tomar a dianteira. O título de Ironman, recebeu em 28 de maio, em Florianópolis (SC), após completar uma prova de triathlon de 14 horas e 16 minutos, quase ininterruptos. Mas a trajetória de Diogo Ratacheski, tão cheia de contratempos e obstáculos, há muito tempo é marcada por vitórias, para alguns talvez, inimagináveis.

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“Eu levanto a bandeira da independência. Quero usar meu exemplo como incentivo”, costuma dizer. Uma das características essenciais para os triunfos desse jovem atleta aflorou muito cedo. Ainda adolescente, demonstrou que tinha a cabeça e o espírito de um legítimo campeão.

Aos 14 anos, venceu o campeonato brasileiro de escalada júnior. Aos 19, já tinha sido duas vezes campeão brasileiro de escalada profissional e conquistado a via de escalada mais difícil do Brasil. Com apenas 20 anos, Diogo se tornou o escalador mais notável da América do Sul ao ser vencedor do campeonato sul-americano. Sem contar que nesse período foi várias vezes campeão paranaense. “O que difere é a cabeça. Tem que acreditar”, afirmou, “simplificando” a fórmula para resultados desse tamanho.

Diogo: tem que acreditar. Foto: Lineu Filho

O acidente

Com 24 anos, porém, Diogo se viu diante uma das barreiras mais determinantes em seu caminho. Era 10 de setembro de 2006. Ele estava em uma festa, acompanhado de um amigo, em Balneário Camboriú (SC). Cansado, resolveu dormir no carro. Acordou quase um mês depois, na cama de um hospital.

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Na noite da festa, ao voltar para Bombinhas, também no litoral catarinense, onde estavam hospedados, o amigo perdeu o controle da direção e o acidente foi grave. Diogo ficou 21 dias em coma, sofreu duas paradas cardiorrespiratórias e várias lesões sérias. A mais grave na coluna, que impossibilitou o movimento das pernas.

Ficou um ano em recuperação no Hospital Sarah Kubitschek, em Brasília. Encarou a fisioterapia com a dedicação dos treinos de escalada. A meta era voltar a andar, mas essa vitória não chegava. O processo de reabilitação começou a fazer mal e Diogo considerou retomar a vida em Curitiba. Decidiu que poderia ser feliz com a cadeira de rodas. “É só um meio de transporte, não muda nada. Essa cadeira aqui é o meu tênis”, compara.

“Essa cadeira aqui é o meu tênis”, diz Diogo. Foto: Lineu Filho

Expectativas superadas

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Contrariando o que disse um professor, que geologia não era para uma pessoa como ele devido aos estudos de campo, Diogo não só concluiu o curso na UFPR, como abriu uma empresa de meio ambiente com êxito. Hoje, 15 pessoas trabalham na firma.

Falando assim, parece que foi fácil, mas não foi nem um pouco. Durante a graduação, Diogo desenvolveu uma úlcera de pressão em um dos glúteos, que levou quatro anos para cicatrizar. Foram 71 visitas médicas, cinco cirurgias, 150 exames e 2.940 curativos. Nos estudos de campo, ele fugia do hotel todas as noites para ir ao hospital trocar os curativos sem que o professor soubesse. “Quando coisas ruins acontecem, eu sempre tento reverter em algo positivo”, indica Diogo.

Mesmo com todo esse sucesso, Diogo sentiu que algo faltava. Descobriu que precisava voltar para o esporte. Tentou a escalada, mas já não era a mesma coisa. Em 2015, junto com a esposa Alexandra Rech, começou a participar de corridas de rua. Completou distâncias mais curtas, depois fez maratonas, no entanto, ainda sentia a necessidade de um desafio superior. Por influência de amigos de infância, decidiu treinar para o triathlon e se dispor a enfrentar longuíssimas distâncias, em intermináveis horas de sacrifício nadando, pedalando e depois correndo para ser um Ironman.

Geólogo-atleta abriu empresa de sucesso em Curitiba. Foto: Lineu Filho

Luta contra tudo

Diogo estava completando uma das subidas da Maratona de Curitiba. Era junho de 2015 e ele tinha retornado há pouco tempo para os esportes de rua. Ainda usava uma cadeira comum, pouco apropriada para corrida. Uma corredora desconhecida, que passava por ele, o ajudou a subir por alguns metros e depois seguiu caminho.

Nessa época, Diogo já pensava em se preparar para provas de triathlon e dois meses depois da maratona, foi até a academia Gustavo Borges para reaprender a nadar. Se deparou com aquela mulher que o havia auxiliado na subida da corrida e teve a grande surpresa ao saber que ela era Vanuza Maciel, um dos ícones brasileiros do triathlon, com mais de 25 anos de experiência e diversas provas de Ironman e Ultraman na bagagem.

Vanuza aceitou ser técnica de Diogo. Em janeiro de 2016 ele conseguiu a handbike (cadeira adaptada como bicicleta) e nada mais o impedia de participar das provas. Em fevereiro do ano passado fez um short triathlon em Itapoá (SC). Foram 750 metros nadando, 20 quilômetros de bicicleta e outros cinco de corrida.

Em agosto do mesmo ano, Diogo completou a prova em Foz do Iguaçu com 1,9 quilômetro de natação, 90 quilômetros de ciclismo e 21,1 quilômetros de corrida. É a metade de uma prova de Ironman. De forma quase repentina, Diogo ficava muito próximo do objetivo.

Próxima meta é o Mundial no Havaí. Foto: Lineu Filho

O arremate

Nove meses depois, estava em Florianópolis para o teste final antes de ser um “homem de ferro”. Com o céu nublado, Diogo entrou na água às 7h05, acompanhado do Luiz Rissato, que assim como Vanuza, já completou provas de Ironman e Ultraman. Apesar de alguns problemas na orientação, nadando no meio daquele batalhão de competidores, Diogo venceu a etapa de 3,8 quilômetros no mar em pouco mais de duas horas e meia.

Nos 180 quilômetros de pedalada que se seguiram, o frio e a chuva o castigaram. Diogo passava vaselina embaixo dos braços para dar fluidez aos movimentos, mas não era suficiente e algumas assaduras se formaram. Apesar disso, completou a segunda etapa em cima da handbike em sete horas e quarenta minutos.

Antes dos 42 quilômetros de corrida, os membros da equipe de Diogo perceberam que ele estava com início de hipotermia. A circulação e a sensação térmica funcionam diferente de outros atletas. Quando sentiu frio, o corpo já estava bastante debilitado. Diogo vestiu uma jaqueta corta-vento e encarou a corrida até o final. Nem mesmo o problema em uma das rodas tirou ele do jogo. Em quatro horas e meia, cruzou a linha de chegada, aplaudido pela multidão, emocionada ao vê-lo receber a medalha de Ironman.

Superação é a palavra que define a trajetória de Diogo. Foto: Lineu Filho

Havaí é logo ali

Entre 2.100 competidores na prova de Florianópolis, Diogo ficou em 829º lugar. Na categoria que compete, a Handcycle Division, ele é o primeiro no ranking brasileiro e o sétimo na classificação mundial.

Mas esse “homem de ferro” pretende ir além. A próxima meta é o Campeonato Mundial de Triathlon em Kona, no Havaí. “Nada é impossível. A única derrota é não tentar”, enfatiza Diogo. Ele precisa participar das provas classificatórias e alcançar a pontuação necessária para ocupar uma das 2.500 vagas da competição. Para o mundial deste ano, a técnica Vanuza já está classificada. “O ser humano não tem limites e sempre quer mais”, diz ela.

Palestras

Diogo vem ministrando palestras com o título “Nada é impossível”, nas quais conta sobre sua trajetória de vida e mostra como é possível se superar a cada dia.

Contato
Fone: 41 99553-2000
Site: www.diogoratacheski.com
E-mail: aratacheski@hotmail.com
Instagram: @diogo_ratacheski
Facebook: Diogo Ratacheski

Diogo: “A única derrota é não tentar”. Foto: Lineu Filho

Distâncias

  • Ironman
    Prova deve ser completada em um dia
    3,8 km de natação
    180 km de ciclismo
    42 km de corrida
  • Ultraman
    Prova deve ser completada em três dias
    1° dia: 10 km de natação oceânica e 145 km de ciclismo
    2° dia: 276 km de ciclismo
    3° dia: 84,4 km de corrida