Curitiba

“Alfaiate do Tijucas” é referência de qualidade em uma profissão quase em extinção

Escrito por Tribuna do Paraná

Por Luiz Kozak, especial para a Tribuna do Paraná

Quem caminha pelos 31 andares do tradicional Edifício Tijucas, no Centro de Curitiba, sente-se como o viajante de um máquina do tempo: paredes brancas ornamentadas com texturas rústicas emolduram os longos corredores e os pisos de taco, iluminados por uma luz baixa amarelada. Lá embaixo, na galeria, alguns dos vários comércios conhecidos intimamente pelos curitibanos, desde cafés, farmácias a relojoarias. Já no terceiro andar, precisamente instalado na sala 308, um dos mais antigos moradores do Tijucas convida os clientes a se sentarem em uma cadeira de estofado preto antigo, mas muito bem cuidado e brilhoso.

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O anfitrião é um ilustre curitibano, mesmo que não tenha nascido na capital paranaense. Ibaitiense de origem, “seo” Adão de Oliveira, 77 anos, considera Curitiba sua verdadeira casa. Alfaiate desde os 19 anos, vive na cidade desde 1974, quando decidiu voltar do interior de São Paulo e tentar a vida em uma cidade “mais próspera”, segundo ele analisava à época. “Quando era jovem, trabalhei como cerâmico, lá em Ibaiti, mas era um trabalho muito pesado. Foi quando meu pai me incentivou a aprender uma profissão, para não sofrer tanto. Virei alfaiate”, relembra.

Há 58 anos, quase o mesmo tempo de existência do Edifício Tijucas (construído em 1959), Adão relembra o início da carreira. “Fui para São Paulo para aprender a fazer ternos completos. Na época, só tinha conhecimento sobre calças e foi uma época interessante. Mas voltei para Ibaiti e, logo em seguida, me instalei no Tijucas, onde estou há 48 anos”. O edifício, inclusive, foi seu lar na década de 1970. “Além de possuir o ateliê aqui, também morei no prédio durante um tempo, aí me casei, tive filhos e fui morar no bairro Uberaba, onde vivo até hoje”.

Talento a serviço do “bem vestir” em Curitiba. Foto: Gerson Klaina

Como alfaiate, seo Adão atende de advogados a médicos, mas diz que a covid-19 atingiu em cheio o seu negócio. Mesmo assim, ele pega o ônibus todos os dias (nunca tirou a carteira de habilitação, nem nunca fez questão), de segunda a sexta-feira, e vai em direção ao trabalho. “Acho que fiz somente uns três ou quatro ternos desde o começo da pandemia. Vou levando, mas agora as coisas estão voltando ao normal. Esses dias, um só cliente me trouxe três ternos para reformar, graças a Deus”, comemora.

Orgulhoso da profissão, que considera um dom, o alfaiate revela qual é o maior orgulho de seu ofício: ter criado os dois filhos e proporcionado oportunidades que não foram possíveis a ele quando jovem. “Criei os dois, sempre com muita dificuldade, mas ganhei um dinheirinho nesse tempo todo. Um é caminhoneiro e o outro bancário. Tenho três netas lindas também”, diz.

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Viúvo há dois anos, Adão reflete sobre a vida e o futuro – dele e da profissão que ama. “Hoje vivo sozinho em um sobrado grande, penso em sair de lá, até porque fiquei doente há uns tempos atrás. Labirintite, sabe o quê é?”, questiona ao repórter da Tribuna do Paraná. “Mas estou bem. Consegui comprar um terreninho e formar minha família. A única tristeza é que tenho a impressão de que a alfaiataria, como profissão, uma hora vai acabar. Já está acabando, né? A nova geração não se interessa muito nisso”, analisa.

A previsão do alfaiate pode até se concretizar, mas enquanto “os velhos guerreiros” (como ele mesmo diz) continuarem no ofício (só no Tijucas, existem três), o curitibano pode descansar tranquilo: seu terno estará em mãos experientes e seguras.

Foto: Gerson Klaina

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