Vila dos sonhos

Um sonho sonhado junto a milhares de famílias, como a do aposentado Israel Araújo Muniz, 64 anos, deu origem ao primeiro projeto de moradia popular do Paraná, em 1966: o conjunto habitacional Nossa Senhora da Luz, na Cidade Industrial de Curitiba (CIC). Israel teve a satisfação de ver seu pai, o incansável trabalhador Antônio Pereira Muniz, realizar o sonho da casa própria. E também foi o responsável pela entrega de 60% das chaves para as 2,1 mil famílias da vila.

Israel foi o responsável pela entrega das chaves para as 2,1 mil famílias da vila. Foto: Ciciro Back

“Foi a primeira casa que ele adquiriu na vida, mesmo trabalhando muito, desde a infância, em minas de carvão mineral e carregando sacas de café em Figueira [interior do Paraná]. Mas todo esse esforço não permitia ter o suficiente para comprar uma casa, que até hoje é sinônimo de tranquilidade.

Isso só foi possível com a vinda para Curitiba e a inscrição no programa”, conta Israel. Ele lembra que suas atribuições não se limitavam à entrega das chaves. “Eu precisava verificar as condições de cada moradia e repassar qualquer problema para a Suviluz (Superintendência da Vila Nossa Senhora da Luz), autarquia da Cohab criada para gerenciar isso”, explica. “As casas eram em dois padrões, de 43 metros quadrados ou 54 metros quadrados, e dispostas em ruas nomeadas no sistema alfanumérico, o que gerava dificuldade para os moradores nos primeiros dias”, descreve. “Certa vez, entreguei as chaves de manhã para um vizinho novo e à noite, depois que ele voltou do trabalho, precisou bater na minha casa para eu ajudá-lo a encontrar a própria residência”.

A experiência o conduziu ao cargo de presidente da Associação de Moradores da Vila Nossa Senhora da Luz por quase 20 anos. “Virou paixão pela vila e por querer melhorar o lugar em que moramos. Mesmo agora, que deixei a presidência, continuo envolvido com a associação, pois ainda tenho o sonho de ver a vila como um dos cartões postais de Curitiba”, explica. Personagem principal “O presidente da associação de moradores é mais importante que um vereador”, diz Israel. “É ele que vive o dia a dia do lugar e sabe o que afeta os moradores. As pessoas precisam aprender a cobrar sempre, pois onde não há pressão não tem melhoria”, ensina. Dentre as transformações obtidas com a participação da associação, Israel destaca o asfaltamento das ruas, as duas creches, unidade de saúde, o Centro de Referência de Assistência Social (Cras), um terminal de ônibus, três escolas municipais, melhora na iluminação pública, incluindo 12 praças com refletores e câmeras.

“Costumo dizer que onde tem luz o diabo não chega”. Outro motivo de orgulho foi de ver os nomes das ruas passarem de alfanuméricos para nomes de moradores do conjunto ou parentes próximos.

Ruas recebem nomes de moradores do Conjunto. Foto: Ciciro Back
Ruas recebem nome de moradores do Conjunto. Foto: Ciciro Back

Além disso, ele diz que a instalação da Unidade Paraná Seguro (UPS) melhorou a sensação de insegurança na vila. “Entre 2009 e 2010 teve um dia que houve três assassinatos no conjunto. Foi um tempo muito pesado, mas felizmente isso acalmou um pouco, embora ainda seja um dos principais desafios daqui”, reconhece. Este ano, Israel se mudou momentaneamente para o bairro Fazendinha, porque quer reformar a casa que ele adquiriu com a esposa, seis anos depois da mudança para a vila. “Mas quem mora na vila não consegue sair. Estou quase todo dia lá”, explica. A residência de Israel foi uma das casas deixadas por quem não conseguia pagar o financiamento. “Apesar de ser um projeto popular, o poder aquisitivo naquela época era tão baixo que tinham pessoas que não conseguiram arcar com as 300 prestações da Cohab, que correspondiam a um valor de no máximo 10% da renda”, comenta.

“Eu e minha esposa conseguimos a nossa casa em 1972, onde tivemos três filhos, todos batizados na mesma igreja em que casamos, na Paróquia Nossa Senhora da Luz”, conta, orgulhoso. Pipoqueiro paranista Dono de uma memória impressionante, ele usa as mídias sociais para postar curiosidades sobre a história da Vila Nossa Senhora da Luz ou do endereço anterior, na Vila Capanema. “Quando chegamos a Curitiba, meu pai comprou um carrinho de pipoca para eu trabalhar bem ao lado do Estádio Durival Brito e Silva. Na época, eles liberavam a entrada no final da partida e acabei torcendo para o Ferroviário, depois Colorado até virar paranista e amigo grandes jogadores”, comenta. Na visão dele, a cidade mudou para melhor. “Curitiba teve a sorte de ter um histórico de bons prefeitos, pessoas comprometidas a fazer uma cidade melhor”, opina.

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Magaléa Mazziotti

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