Pesca no asfalto

Realizar um protesto silencioso contra quem joga lixo na rua e, por vezes, lucrar com isso. Este é o objetivo do “pescador do asfalto”, que atende pelo nome de Nelson Litenski de Faria, 27 anos, e há alguns meses passou a dedicar parte do seu tempo a uma pescaria diferente, nos bueiros do Centro de Curitiba. Uma parte da atividade pode ser vista nas mãos do pescador, que exibe com orgulho que “a maré” está cheia.

Nelson começou a mexer nos bueiros pra tirar lixo. Mas acabou encontrando objetos de valor. Foto: Cicíro Back
Nelson começou a mexer nos bueiros pra tirar lixo. Mas acabou encontrando objetos de valor. Foto: Cicíro Back

Desde que saiu do último emprego, em uma serralheria, Nelson tem se desdobrado em diversas atividades para garantir uma renda, enquanto busca uma recolocação. “Posso fazer panfletagem, trabalhar em lanchonete, pois busco qualquer emprego para melhorar de vida”, garante.

A pescaria em bueiros é fruto de um dos serviços temporários de Nelson. Morador de Colombo, ele cuida e auxilia no transporte de um cadeirante. “Meu vizinho precisava de alguém que se deslocasse com ele na ida e na volta para a XV de Novembro e eu passei a fazer isso. E foi nesse longo intervalo buscando coisas para fazer que comecei a observar os bueiros entupidos das ruas do Centro”, observa. “O mundo está imundo e essa falta de consciência leva a trágicas enchentes, as pessoas enfiam muitos guarda-chuvas quebrados nos bueiros. Só que ao decidir recolher esse material acabei encontrando peças de valor”, explica.

Nas mãos, ele mostra os frutos da pescaria dos últimos meses.  Foto: Cicíro Back
Nas mãos, ele mostra os frutos da pescaria dos últimos meses. Foto: Cicíro Back

Com as habilidades de serralheiro, ele desenvolveu um kit de ferramentas para diversos tipos de desafios. “Quando o bueiro é pouco profundo, prefiro amarrar uma pinça no cordão e descer para pegar. Em outros, uso o imã, só que ele não pesca todos os metais. Para peças de ouro e prata uso mais o arame com gancho na ponta”, descreve.

Nessa busca, ele já encontrou correntes de prata, anéis de ouro e brincos. Um anel de prata e uma tríplice aliança que ele carrega em uma das mãos são as peças de que ele mais gosta. “Só me desfaço se pagarem muito bem”, conta. Ele conta que já faturou R$ 35 com uma única peça de prata. “É mais interessante do que catar sucata e latinha”, compara Nelson, que por 15 anos ajudou a mãe na coleta de materiais recicláveis.

Segundo Nelson, atitude é um protesto contra quem suja a cidade. Foto: Cicíro Back
Segundo Nelson, atitude é um protesto contra quem suja a cidade. Foto: Cicíro Back

Sonhador, ele tem fé que de repente venha do bueiro um tesouro que o ajude a melhorar de vida. “Enquanto isso não acontece, estou conseguindo encontrar o suficiente para me manter e ainda ajudar a cidade com a desobstrução dos bueiros. Aliás, acho que a prefeitura tinha que ter um serviço especializado de limpeza permanente dos bueiros para evitar as enchentes”, recomenda.

Outra observação que o pescador faz questão de deixar registrada é sobre os transtornos causados pela mudança na linha Colombo-CIC. “Com a desintegração, estamos levando duas horas para chegar ou retornar daqui e precisamos trocar três vezes de ônibus e isso é bem desgastante”, constata.

Leia mais sobre o Centro

Sobre o autor

Magaléa Mazziotti

(41) 9683-9504