Capão da Imbuia

Ex-modelo

Foto: Felipe Rosa
Escrito por Giselle Ulbrich

Por que o transporte coletivo de Curitiba deixou de ser referência mundial?

Curitiba já foi modelo de transporte coletivo para o mundo. Não é mais. Pelo menos esta é a opinião do povo, que anda insatisfeito com a qualidade do sistema. As reclamações são de ônibus muito cheios nos horários de pico, quantidade de veículos que não dá conta do fluxo, carros velhos e que sempre quebram, invasões, assaltos, atrasos, entre outras reclamações.

As amigas Terezinha Ribeiro, 54 anos, Cláudia Novakoski, 44, e Joelma de Castro, 47, trabalham juntas como atendentes de telemarketing. Cada uma vem de um canto da cidade, em direção ao Capão da Imbuia, para o trabalho. Terezinha mora no Caximba e diz que os alimentadores da região sempre quebram. “Ontem mesmo quebrou. Cheguei 30 minutos atrasada no trabalho. E o Inter 2 não tem hora certa pra passar. Sem contar que são lotados. No terminal do Capão da Imbuia, o ônibus já vem cheio do Centro, quase não dá pra embarcar. A população aumentou muito e não tem ônibus suficiente”, diz.

Cláudia vem de Colombo e diz que por lá circulam muitos ônibus velhos. “A porta enguiça, tem que ficar esperando até abrir. Aumentaram a tarifa pra melhorar o transporte, prefeito falou que ia trocar os ônibus, mas cadê?”, questiona.

Daiane reclama do transporte público de Curitiba. Foto: Felipe Rosa.
Daiane reclama do transporte público de Curitiba. Foto: Felipe Rosa.

Caindo aos pedaços

Joelma também já presenciou e viu na TV casos de ônibus literalmente caindo os pedaços. Ela já esteve num ligeirinho Pinhais que a porta caiu para dentro. Sorte que ninguém se machucou. Também lembra da notícia que viu na TV, da porta de um biarticulado da linha Santa Cândida/Capão Raso que caiu inteira para fora.

A auxiliar de enfermagem Daiane de Paula, 35, classifica o transporte coletivo como horrível. Ela já pegou vários coletivos que quebraram no caminho. Os passageiros tiveram que desembarcar e esperar o próximo. Mas o caso mais recente que ela viu foi do ônibus que pegou fogo, dentro do terminal do Centenário. “O motorista mesmo nos falou que falta manutenção nos carros”, relata ela, que ainda reclama das invasões, assaltos e abusos. Ela quase teve um celular roubado há um mês, quando um homem armado invadiu o ônibus. “E um motorista já me falou pra não ficar com o celular na mão dentro do coletivo. Os marginais entram no ônibus pela porta quatro, pegam quantos celulares conseguirem e fogem. Pela qualidade do transporte, a passagem é muito cara”, reclama.

Helga destaca que os ônibus estão muito cheios. Foto: Felipe Rosa.
Helga destaca que os ônibus estão muito cheios. Foto: Felipe Rosa.

Caro demais

Já a vendedora Helga Frieling, 39, usa pouco o transporte coletivo durante semana e o considera bom. Só acha um pouco apertado em certos horários. Mas a grande reclamação é em relação à tarifa domingueira, mais barata aos domingos, que não existe mais. “Antes eu sempre ia passear com a família aos domingos. Agora preciso pensar e calcular se vou”, comenta.

Kátia acredita que a tarifa está muito salgada. Foto: Felipe Rosa.
Kátia acredita que a tarifa está muito salgada. Foto: Felipe Rosa.

A diarista Kátia dos Santos da Silva, 32, também acha a tarifa muito “salgada”. Como trabalha como autônoma, tira do seu bolso. “Com a crise, o serviço diminuiu. Quem pegava diarista toda semana agora só pega a cada 15 dias. Em contrapartida, a passagem aumentou. Tá pesado, mas tenho que encarar. Fazer o quê?”, lamenta ela, que mora em Piraquara.

Reclamações

A Urbs têm à disposição dos passageiros o telefone 156, para elogios, sugestões e reclamações do sistema de ônibus. Já o sindicato das empresas de ônibus, o Setransp, reclama de, por questões contratuais, não ter o seu próprio sistema de atendimento para ouvir a opinião dos usuários.

Cadê a frota nova?

O prefeito Rafael Greca prometeu ônibus novos no começo da sua gestão. Mas até agora isso não aconteceu por causa de impasses técnicos e judiciais entre prefeitura e as operadoras de transporte. No início de agosto, Greca esteve na Câmara de Vereadores e declarou que se as empresas não renovassem a frota, o prefeito faria. Também disse que estudaria novas linhas independentes de ônibus (operadas sem a intervenção das empresas de ônibus). Mas quem quiser esperar por novos coletivos ou linhas, espere sentado (se o busão não estiver lotado!). Nada foi resolvido ainda.

LEIA TAMBÉM: Frota renovada traria mais conforto para os passageiros

Curitiba tem uma frota total de 1.656 ônibus, dos quais 1.300 estão na frota operante. Dos 426 veículos vencidos (com mais de 10 anos de uso), 130 circulam normalmente. Se não houver nenhuma renovação, até o final do ano deve aumentar para 529 o total de carros que não deveriam estar rodando. Com isso, passaria para 270 o número de veículos antigos até fevereiro de 2018.

Foto: Felipe Rosa.
Foto: Felipe Rosa.

Por contrato, as empresas são obrigadas a renovar os veículos vencidos. No entanto, o sindicato que as representa (Setransp) conseguiu uma liminar na Justiça que tira da Urbs o poder de exigir a renovação. As empresas explicam que a quantidade de passageiros transportados atualmente pelo sistema é muito menor do que o projetado pela Urbs. É com base nesta projeção que é estabelecido o valor da tarifa técnica (R$ 3,79), pago pela prefeitura às empresas, como remuneração pelo serviço prestado (para pagar combustível, peças, acessórios, folha de pagamento, etc.). Ela é diferente da tarifa social (R$ 4,25), paga pelos usuários nas catracas. A diferença entre tarifa social e tarifa técnica (R$ 0,46) fica com a prefeitura, para pagar seus custos diversos de operação do sistema.

Desequilíbrio

Mas como a quantidade de passageiros projetada está sendo diferente da realizada, as empresas alegam que a arrecadação não vem cobrindo os custos do sistema e por isto elas afirmam não haver dinheiro para a renovação. Por isso pleitearam a liminar, em 2013, que ainda está vigente.
Para reverter a situação, o prefeito Rafael Greca aumentou a tarifa de ônibus em fevereiro (de R$ 3,70 para R$ 4,25), para direcionar parte da quantia extra ao Fundo de Urbanização de Curitiba (FUC), que tem entre seus objetivos a renovação da frota. Conforme a Urbs, em 17 de julho, o FUC já possuía R$ 21.876.818,01, suficiente para a compra de pelo menos 21 biarticulados, já que cada um custa próximo de um milhão de reais.

Foto: Felipe Rosa.
Foto: Felipe Rosa.

Com este aumento de tarifa, a Urbs alega que agora as contas estão equilibradas e o custo do sistema vem sendo coberto e por isto questiona a alegação das empresas de não haver dinheiro para a renovação, já que a prefeitura reembolsa as empresas pela compra dos ônibus (a chamada amortização). Também diz que, com o aumento da tarifa, foi possível colocar em dia o serviço de operação do transporte e acabar com as paralisações no sistema – foram 12 entre janeiro de 2016 e fevereiro de 2017.

Empresas não são contra

Apesar do impasse, as empresas também são a favor da renovação da frota, pois dizem que ônibus “velho”, além de não gerar conforto aos passageiros, gera alto custo de manutenção e gasto de combustível. Mas sem equilíbrio financeiro, alegam que a renovação não é possível. Na semana passada, seis homens, entre eles quatro fiscais da Urbs, tiveram que empurrar um biarticulado que pifou na estação-tubo Carlos Gomes. Conforme o Setransp, a conversa sobre o assunto com a prefeitura foi retomada, várias reuniões têm sido feitas, mas ainda não há uma decisão.

Para resolver o problema do déficit de arrecadação das empresas (que no início do ano estava em R$ 1,3 bilhão), o Setranp dá sugestões, além do aumento da tarifa: políticas de prioridade do transporte coletivo sobre o transporte individual, criação de fontes alternativas de receita para custear os benefícios tarifários (revisão da forma como as isenções de tarifas são concedidas, principalmente apontando fontes de custeio para as isenções, para que elas não recaiam na conta dos demais usuários), modernização do sistema de bilhetagem eletrônica, disponibilização em tempo real de informações aos passageiros, aumento da segurança no transporte coletivo, acompanhamento permanente dos custos e receitas pelos órgãos públicos de controle e sociedade civil, entre outros.

A Urbs informa que não tem poder de rever as isenções tarifárias, já que são amparadas por leis municipais e federais, e por isso se dedica a fiscalizar com rigor as isenções.

Sobre o autor

Giselle Ulbrich

(41) 9683-9504