Cajuru

Pandemia fecha loja de noivas em Curitiba e alfaiate de 73 anos liquida estoque pra aliviar tristeza

Escrito por Alex Silveira

A crise econômica provocada pela pandemia de coronavírus (covid-19) provocou o fechamento definitivo da MCR Noivas, conhecida loja de locação de trajes e promoção de casamentos e eventos do Cajuru, em Curitiba. Encerrar as atividades da loja que funcionou por cerca de 50 anos não estava nos planos do empresário Milton Ferreira Quintas, 73 anos, o “Miltinho das Noivas”.

Triste com o desfecho ocorrido por causa da paralisação do setor de eventos, um dos mais impactados pela pandemia, Miltinho, que é do grupo de risco da covid-19, agora conta com o apoio de uma cliente para vender todo o seu estoque de roupas masculinas e femininas. Vestidos de noiva que custariam R$ 4 mil para compra e cerca de R$ 2,5 mil para locação, estão sendo vendidos por R$ 500.

Segundo Miltinho das Noivas, que leva o apelido por causa da baixa estatura e pelo profissionalismo que sempre empreendeu em seu negócio ao longo dos anos, a chegada da pandemia, em março de 2020, paralisou a área de eventos e ele não teve outro recurso senão se isolar em casa com a esposa Elza Tereza Quintino Quintas, 66 anos, também do grupo de risco. Muitos casamentos foram suspensos ou ocorreram apenas on-line. O último que ele fez de forma presencial foi em junho do ano passado e precisou ser à portas fechadas. O evento só ocorreu só para cumprir o contrato e não decepcionar os noivos. “Eles tiveram que entrar pela cozinha do restaurante. Todas as janelas do local ficaram fechadas. Foi o único jeito de levar felicidade para o casal”, desabafa.

Os meses foram passando ao longo do ano e a decisão de fechar a loja foi tomando os pensamentos de Miltinho. Sentimentos de ansiedade também cresceram dentro dele, que foi ao médico e agora toma remédios antidepressivos para conter a angústia de ter que encerrar o negócio antes da hora. “Não era o plano. Eu sinto muita falta do agito e da alegria de fazer o máximo pelos clientes nos casamentos. É muita tristeza. Minha vida que não parava um minuto, se deparou com o isolamento”, conta Miltinho.

Miltinho conta com a ajuda de uma amiga para vender trajes e vestidos de sua autoria. Foto: Lineu Filho.

Há cerca de um mês, no entanto, uma das clientes e amigas de Miltinho notou a tristeza dele e decidiu ajudar. A gerente de supermercado Priscila Torres Xavier Fonseca, 31 anos, foi até a casa de Mitinho e fotografou todas as roupas para postar em sua conta do Instagram (@priscilatorresxavier). Menos de uma semana depois da primeira postagem, feita perto do Natal, Miltinho realizou a primeira venda de um vestido de noiva, dois ternos e vestidos de madrinhas.

“Um dia, conversando com ele no mercado, notei os olhos cheios de lágrimas, me contando da dificuldade. Perguntei se ele não tinha interesse em vender os trajes e me propus, com a minha irmã e alguns funcionários, a provar os vestidos e anunciar para venda. Ele topou na hora e a emoção foi imensa”, relata a Priscila Torres.

Ternos e vestidos que em lojas custam entre R$ 3 mil e R$ 6 mil, estão sendo vendidos por menos de R$ 1 mil, dependendo do modelo. “Foi a forma que encontrei para dar conta da bagunça que ficou a minha casa. Como tive que entregar o ponto comercial, trouxe tudo para cá. Espero que tudo dê certo”, torce Miltinho.

História

A primeira costura de Miltinho das Noivas foi um vestido de noiva para uma das irmãs dele. O empresário tinha 14 anos de idade e a irmã 16 anos. Ela já faleceu. Na época, Miltinho morava na região rural de Maringá, Interior do Paraná, onde aprendeu a arte da costura observando a mãe. “Tinha preconceito por parte dos meus irmãos, mas eu ligava”, conta. Contando com Miltinho, eram 12 irmãos. “Sou de família grande, nos criamos na roça. Naquela época, era assim”, brinca ele, que tem um casal de filhos – o homem com 47 anos e a mulher com 43 anos.

Aos 25 anos, logo após se casar, Miltinho mudou-se para Curitiba. O primeiro emprego dele na capital não seria outro senão o de alfaiate. “Eu fazia ternos maravilhosos. Trabalhei em diversas lojas renomadas de Curitiba e costurei para pessoas importantes. Três anos depois de chegar, comprei minha própria máquina e comecei a trabalhar por conta própria, já no Cajuru”, relembra.

Da alfaiataria, foi um passo para chegar até os vestidos de noiva. “Alfaiate faz roupas para homens. Um terno bom dura dois anos e o cliente satisfeito demora esse tempo para voltar. As mulheres são mais exigentes, mas elas retornam a cada nova festa marcada. É um caminho natural do negócio”, explica Miltinho, que foi crescendo no mercado e sempre manteve uma equipe de costura com ele. “Sempre conseguimos atender a todos com qualidade, homens e mulheres”.

Da costura própria, a loja foi progredindo para o sistema de locação de roupas de festas e casamentos e para a realização de eventos. A equipe era composta por pessoal de apoio como músicos, fotógrafos, cerimoniais, costureiras, cabeleireiras, designers de convites entre outros. “Sempre fiz questão de estar pessoalmente nos casamentos, cuidando da noiva. Ela é a rainha, pode tudo. Trabalhava me divertindo e sinto muita falta disso desde março, quando veio a pandemia”, lamenta.

Na casa dele, a primeira coisa que a reportagem viu em destaque na sala, além da simpatia de Miltinho, foram duas placas de homenagem que o empresário exibe com orgulho. O prêmio de melhor do ano no ramos das noivas da Pesquisa Conceito, de 2015, e uma texto singelo de 2011 assinado por quatro irmãs que o Miltinho casou, uma depois da outra. “[…] um homem simples que faz do seu trabalho o início do sonho de muitas pessoas. Mãos que alinham, fazem bainhas, seguram presilhas e botões. Mãos que aplicam elásticos, que bordam maravilhas fazendo com carinho cada detalhe, cada ajuste do tão sonhado vestido de noiva”, diz o texto assinado “carinhosamente” pelas irmãs.

Miltinho ganhou o prêmio de melhor do ano no ramos das noivas da Pesquisa Conceito, de 2015. Foto: Lineu Filho.

Para comprar as roupas

Além do contato pela conta do Instragam da Priscila Torres, as compras das roupas podem ser feitas pelo telefone (41) 3267-7557. Vale lembrar que é preciso ir de máscara e levar álcool em gel para ver os vestidos e ternos.

Sobre o autor

Alex Silveira

(41) 9683-9504