Bom Retiro

Toque de anjo

Escrito por Samuel Bittencourt

Dentre as diversas histórias que rondam os corredores de um hospital, existe algo que une as diferentes pessoas que aguardam a melhoria da saúde e o retorno para a vida cotidiana. Esse elo é a solidariedade que surge para enfrentar os dias difíceis causados pelas enfermidades. Com esse pensamento altruísta, há mais de cinco anos o titular do primeiro-violino da Orquestra Sinfônica do Paraná, Paulo Torres, dedica suas sextas-feiras para encantar os ouvidos dos pacientes do Hospital Pilar.

Tudo começou quando uma parente do violinista estava internada e passava por um período complicado. Foi nesse momento que Torres fez a única coisa que estava ao seu alcance para aliviar o sofrimento de sua tia enferma. “Na época fazia companhia para minha tia e para alegra-la comecei a tocar o violino suavemente. Nesse dia a vizinha de quarto ouviu encantada e pediu para que eu também tocasse um pouco de música para ela”, lembra.

Desde esse dia o violinista nunca mais parou. Pelo contrário, ele até conseguiu reforços e ampliou seu trabalho voluntário. “Já faz um tempo que o talentoso Marcos De Lazzari me acompanha também tocando em asilos e presídios. Mas o legal do trabalho aqui no hospital é que quando sentimos que o paciente responde à música que tocamos, saímos com uma satisfação sem tamanho”, afirma. Torres conta que o motivo que o faz retornar todas as semanas é a busca por histórias de vida.

O violinista percorre pacientemente corredor por corredor, de cada andar do Hospital Pilar. Geralmente ele passa cerca de duas a três horas para completar os mais de cem leitos do hospital. Quando conquista os ouvidos dos pacientes, além dos próprios funcionários do hospital, ele não apenas entra nos quartos, mas também passa a fazer parte das vidas das pessoas que o ouvem. “Geralmente quando uma pessoa está em um hospital ela fica pensando em exames e no que acontecerá. É uma grande tensão. Quando ele chega com o violino deixamos todos esses pensamentos para trás e isso nos dá muita força”, afirma o advogado Álvaro Kalil Gonçalves.

O repertório de Paulo é tão vasto quanto o currículo do violinista. Nos corredores do hospital, o maestro de renome internacional executa desde clássicos eruditos até a musicas populares. A preferência é pelo estilo barroco e músicas eruditas. O músico revela que essas músicas provocam um efeito mais positivo nos pacientes. “Tento tocar essas músicas alegres como os clássicos eruditos, pois músicas mais românticas tendem a ser mais tristes e acabam pondo para baixo as pessoas. Mas eles pedem de tudo, e quando vemos o perfil da pessoa tentamos adaptar o som ao gosto”, afirma.

Remédio comprovado

O efeito do violino de Torres já foi comprovado. Mais de uma vez em que tocava pelos corredores da UTI do Hospital Pilar, pacientes que estavam em coma responderam ao som do violino. “Uma vez levei um susto, pois estava tocando e a paciente abriu lentamente os olhos e ficou me observando. Nesse instante entraram na sala alguns médicos e enfermeiras e não entendia direito o que acontecia. Foi quando eles me contaram que ela estava em coma há 4 anos sem nenhum sinal de melhoria”, lembra.

De acordo com a médica chefe do pronto atendimento e da UTI, Fabiana Weffort Caprilhone, o remédio que a música traz é comprovado cientificamente. “Já foram realizados muitos estudos atestando o efeito da música na liberação de serotonina no organismo, que acaba ajudando aliviar a dor. Mas até mesmo acompanhando pelos aparelhos é fácil notar que pacientes que estão em coma vigil reagem à música. Alguns pacientes que possuem doenças degenerativas até se viram para o sentido que a música entra nos leitos”, conta a médica.

Para Paulo a iniciativa de dedicar seu talento a pessoas que enfrentam dificuldades poderia ser seguida por outros. “Qualquer pessoa que possui alguma habilidade deveria dedicar algum tempo de sua vida para o próximo. Na parede de minha casa tenho um quadro pintado por uma mulher, que antes de morrer fez seu filho prometer que me entregaria. Ela fez isso porque apenas alguns minutos em que toquei para ela tiveram tanta importância que antes de falecer ela se lembrou desse gesto”, conta.

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Samuel Bittencourt

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