O gigante Galbraith

John Kenneth Galbraith foi um dos mais importantes economistas e pensadores econômicos do Século XX. Professor emérito de economia da Universidade de Harvard aliou a teoria à prática, em funções executivas nos diferentes governos democratas dos EUA. É dos autores mais editados e lidos na história da economia. O fundamento da sua vasta obra é tratar o processo econômico como um aspecto da sociedade e da cultura e não uma disciplina de números. Crítico mordaz, dizia: ?Muitos economistas são econômicos, entre outras coisas, de idéias; a maioria fez as de seus tempos de universidade durarem uma vida inteira?. Ao desaparecer recentemente, aos 97 anos, Kenneth Galbraith deixou um acervo de 33 livros marcantes para a história do pensamento econômico. Foi um expoente da escola econômica institucionalista, que atribui mais importância às instituições que aos mercados. Relativisava o rigor matemático e econométrico na análise da sociedade norte-americana, demonstrando que as grandes corporações manipulam o mercado a seu favor. Daí recomendar aos mercadistas que lessem Adam Smith com inteligência. Veriam que em A Riqueza das Nações ele é muito menos mercadista do que se propaga.

Polêmico e provocativo, desafiava os arautos das previsões na economia: ?A única função das previsões econômicas é fazer a astrologia parecer respeitável?. Contestava, com ironia, a luta de classes: ?No capitalismo, o homem explora o homem. No comunismo é justamente o oposto?. Se dizia ?keynesiano evangélico?, em função de uma das suas maiores influências intelectuais ter sido o economista inglês John Maynard Keynes.

Na década de 30 integrou a equipe econômica que elaboraria, no governo Franklin Delano Roosevelt, o programa ?New Deal?, que tinha Keynes como coordenador. Retirou os EUA da grande crise e depressão de 1929, que havia levado ao maior desastre financeiro do moderno capitalismo. Ao defender a atuação massiva do governo em investimentos sociais e gastos para combater o desemprego, o ?New Deal? rooseveltiano fez nascer uma ordem econômica compromissada com os valores humanistas. A prioridade era o emprego e a subsistência com dignidade. Consolidou uma forte classe média.

No terceiro mandato de Roosevelt, organizou e administrou a Comissão de Controle de Preços durante a II Guerra Mundial. Torna-se um dos redatores principais dos discursos do grande presidente norte-americano. É figura fundamental na história do Partido Democrata. Na década de 50, nas eleições presidenciais de 1952 e 56, vencidas por Dwight Eisenhower, do Partido Republicano, foi o principal conselheiro do candidato democrata Adlai Stevenson.

Em 1960, com a vitória de John Kennedy, convidado para integrar o governo, escolhe ser embaixador na Índia, entre 1961 e 1963. Com o assassinato de Kennedy, volta aos EUA, tornando-se conselheiro do presidente Lyndon Johnson e um dos autores do programa ?Great Society? (Grande Sociedade) que promoveu a maior reforma social já realizada na economia norte-americana. Em 1958, havia lançado o livro The Affluent Society (Sociedade Afluente), considerado pelo jornal inglês Daily Telegraph, um dos dez livros que mais marcaram o Século XX. Em 1987, escreve O Novo Estado Industrial. Essas duas obras são a base do programa ?Grande Sociedade?, que surpreendentemente transformou Lyndon Johnson no grande reformador. Quem o derrubou foi a guerra do Vietnã.

O último presidente dos EUA que o teve como conselheiro foi Bill Clinton e suas opiniões eram acatadas com rigor, já que enfatizava que a economia não pode ser abstrata, isto é, isolada das questões ideológicas, políticas e sociais. E nisso voltava às origens da Economia Política, depois transformada em Teoria Econômica e hoje Ciência Econômica, não obstante não ser ciência exata, mas integrante da escola das ciências sociais. Daí ser considerado um economista-sociólogo.

O seu livro A Era da Incerteza originou-se de 12 programas de televisão produzidos pela BBC de Londres, nos quais traçava o roteiro da economia, capitalismo e desenvolvimento econômico. Tanto o livro como as gravações encontradas em vídeos de grande valor didático até hoje são requisitados em todo o mundo.

A síntese da sua vida acadêmica foi assim definida pelo economista Paul Samuelson: ?Galbraith será lembrado e lido quando a maioria de nós, Prêmios Nobel, estiver enterrada em notas de rodapé nas estantes empoeiradas das bibliotecas?.

Um belo e verdadeiro epitáfio.

Hélio Duque é doutor em Ciências, área econômica, pela Universidade Estadual Paulista (Unesp). Foi deputado federal (1978-1991) e é autor de vários livros sobre a economia brasileira.  

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