Entrei no amplo salão com certa cautela. Havia homens e mulheres que jamais vi na vida. Alguns me faziam mesuras. Eu devolvia os cumprimentos meio hesitante.

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Já estava pensando em ir embora quando ouvi uma voz grave que sobressaiu do alarido dos convivas. Era o anfitrião que falava com os empregados e se preparava para fazer a primeira aparição da noite. E que aparição!  O cara parecia ter saído direto do filme Bem-Hur. Usava vestes romanas: uma túnica e por cima uma volumosa toga branca que lhe envolvia todo o corpo.

Era muito alto, tive que olhar para cima para responder a sua saudação e isso que eu tenho 1,90m.

O anfitrião era o primeiro rosto que achei familiar naquele ambiente. Mas de onde o conhecia?

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De súbito veio a lembrança: dos livros de história. Adriano! Não pode ser… Mas ali estava para quem quisesse ver: um dos grandes imperadores romanos, que governou Roma entre 117 a 138, desfilava entre nós.

A um sinal seu, os serviçais começaram a se movimentar para servir a ceia. Estranho que não havia o mais leve cheiro de comida no ar. Entraram quatro homens uniformizados, carregando um tacho de água fervente e depositaram no meio do salão.

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Fez-se um silêncio obsequioso. O imperador sentou-se numa cadeira em frente ao panelão pelando de quente, desatou a sandália e mergulhou o pé direito no líquido borbulhante. Pensei comigo, este homem vai se desgraçar! E ninguém fazia nada para impedi-lo. Mas Adriano não gritou por socorro, também não chorou ou desmaiou. Como é que suportou aquela dor lancinante?

Ao cabo de alguns minutos o imperador ergueu a perna. O pé havia sumido, só ficou o toco da canela. Procurei alguma expressão de dor em seu rosto e só encontrei serenidade.

Os empregados retiraram o tacho imediatamente e alguns minutos depois retornaram com muitas travessas. Agora sim havia uma atmosfera com cheiro inebriante de boa comida. E o imperador Adriano? Já circulava de mesa em mesa e o mais estranho é que o pé que ficou dentro do tacho – e a esta altura estava sendo devorado no banquete -, não lhe fazia falta.

Se a comida estava boa não sei. Felizmente acordei antes de provar. Canibalismo nunca me fez a cabeça, apesar de aplaudir o sacrifício de Adriano que é considerado um dos cinco bons dirigentes do Império Romano.

Não sei o significado deste sonho, mas é um comparativo interessante com os tempos que estamos vivendo: um nobre romano corta da própria carne para alimentar seu povo, enquanto os nossos governantes querem criar impostos para financiar o rombo criado por eles. Viva Adriano!