Tratando-se de roupa, existe para o consumidor o direito a troca da mercadoria?

É muito comum o consumidor adquirir roupas e confecções para si ou para dar como presente e depois haver a tentativa de troca, sob a alegação de que o tamanho não se revelou adequado ou houve desagrado quanto a aspectos como cor, modelo ou tipo de tecido. Devido ao hábito de compra de roupas para membro da mesma família (por exemplo: a esposa comprar as roupas do marido e/ou dos filhos) também surgem muitas tentativas de troca desta espécie de mercadoria. Nesse contexto, embora exista até uma certa praxe tradicional em nosso comércio aceitando as trocas, principalmente nos casos em que o consumidor não é cliente tradicional da loja, são freqüentes os desacertos quanto a esta questão. Cabe, então, examinar-se se a troca é ou não direito assegurado ao consumidor. E, em caso positivo, em quais circunstâncias e sob que condições ela é devida?

As respostas principiam por dizer-se que consoante o prescrito no Código de Proteção e Defesa do Consumidor (Lei 8078/90), todo consumidor tem direito a produtos com qualidade em sentido amplo. A Teoria da Qualidade adotada pelo CDC sinalizou para a sociedade, o elevado padrão de qualidade que deve ser preconizado para as mercadorias colocadas no mercado de consumo. Deste modo, os produtos com qualquer tipo de vício lato sensu (defeito que afeta a saúde ou segurança do consumidor ou vício strito sensu caracterizado pela impropriedade ou inadequação que afete prejudicialmente o patrimônio do consumidor), geram para o adquirente ou utente, o direito a troca ou mesmo a valer-se das alternativas de composição estabelecidas no art. 18 do CDC, como conserto, complementação, troca por outro produto, desconto no preço ou devolução do dinheiro inteiramente corrigido. Em sentido diverso, os produtos que não apresentam defeito ou vício, em princípio, não conferem direito ao adquirente de obter a troca ou indenização. Utilizei a ressalva ?em princípio?, devido ao fato de que, sempre que o fornecedor promete este tipo de troca, independente de que o faça por escrito ou verbalmente, assume o dever de realizá-la em cumprimento aos termos do compromisso que firmou. E mais, importante que a troca aconteça sob forma e condições idênticas as da contratação. Ou seja, que o comerciante não destine local inapropriado para realizar a troca ou que a condicione a determinados dias ou horários restritivos para o consumidor. A disposição e disponibilidade para trocar deve ser idêntica a que foi demonstrada para vender.

Como espécie de costume nacional, observa-se que nas compras em que o consumidor informa ser para presente, é usual o comerciante assegurar o direito à troca, o que, repetimos, estabelece compromisso que não poderá ser descumprido, sob pena de ensejar para o consumidor, o direito de acionar este fornecedor, seja pela via administrativa (Procon) para obter uma composição, seja pela via judicial para que a tutela jurisdicional venha impor a realização do que foi prometido ou mesmo assegurar uma indenização. Outro detalhe: quando a venda tiver acontecido fora do estabelecimento comercial do fornecedor consoante o previsto no art. 49 do CDC, independente do motivo alegado (ou mesmo diante de inexistência de justificativa), o consumidor tem direito não só a trocar, como até mesmo simplesmente devolver o produto obtendo, em dinheiro, a devolução em valores corrigidos do pagamento efetivado (ou eliminação das prestações que tenha assumido). É importante ressaltar que as vendas pela internet não fogem a estas regras. Apesar de existir intensa discussão jurídica quanto ao local em que se realizam as vendas por meio informático, na medida em que alguns entendem que a internet é um meio e outros de que seria um local de venda acionado pela iniciativa do consumidor, tal não é suficiente para afastar o direito de arrependimento previsto no CDC, pois se trata de um prazo de reflexão para quem não pode aferir convenientemente as qualidades e condições de venda do produto. O mesmo se aplica aos casos de aquisição de confecções através de máquinas que permitem o auto-atendimento pelo consumidor, pois embora seja deste a iniciativa de acionar a compra, a simples falta de possibilidade de exame prévio da mercadoria para só depois decidir a compra é suficiente para agravar a vulnerabilidade do consumidor (hipossuficiência na relação).

Por outro lado, para realizar a troca é facultado ao comerciante exigir que o consumidor apresente documento comprobatório de que o produto foi adquirido naquele estabelecimento comercial ou em sua rede (naturalmente, quando o comerciante cumpriu devidamente seu dever de fornecer a nota fiscal). Note-se que fornecer documentos fiscais é obrigação exclusiva do comerciante e a simples omissão do consumidor em não exigi-la, embora reprovável, não retira dele qualquer prerrogativa relativa ao direito a receber mercadorias de qualidade ou valer-se da possibilidade de devolver o produto dentro do prazo de reflexão (art. 49 do CDC).

Assim, quando o produto não apresentar problemas (defeito ou vício) ou não houver o benefício da desistência imotivada por ter sido contratação à distância, o comerciante, salvo que tenha feito a promessa, não está obrigado a trocar ou receber em devolução a mercadoria vendida, no caso a roupa adquirida pelo consumidor. Em sentido diverso, produtos com problemas devem ser trocados imediatamente ou serem objeto de devolução com respectiva recomposição quanto aos valores pagos ou prestações assumidas. Reitere-se, por derradeiro, que o consumidor deve exigir sempre a nota fiscal da compra e apresentá-la quando for intentar a troca. Vantagens advirão para todos os envolvidos quando esta prática considerada salutar no sentido de contribuir para a harmonia no mercado de consumo, acontecer de modo a não ferir a dignidade e os legítimos interesses econômicos do consumidor.

Oscar Ivan Prux é advogado, economista, professor, especialista em Teoria Econômica, mestre e doutor em Direito. Diretor do Brasilcon para o Paraná.

Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor – BRASILCON