Terror na Ilha das Cobras

Cercada de água, óleo e contêineres por todos os lados, a Ilha das Cobras tem página cativa na história e capítulo à parte nos anais do folclore. Um desse casos da ilha faz parte do livro “O Rádio do Paraná – Fragmentos de Sua História”, de Ubiratan Lustosa. Um dos maiores nomes do rádio brasileiro, Ubiratan viveu momentos de “Terror na Ilha”, conforme o relato que segue: 

“Nos anos 60, quando atuávamos na Rádio Clube Paranaense, o Moacir Amaral, o Hugo Von Linsingen e eu fizemos muitas pescarias. Frequentemente a gente aproveitava os fins de semana para pescar no litoral paranaense. Certa vez nós conseguimos com a administração do Porto de Paranaguá a cessão de um barco com dois tripulantes e a autorização para passarmos a noite na Ilha das Cobras. Como o barco era grande, convidamos o Mário Vendramel, o Luiz Gonzaga de Freitas, o Ewaldo Von Linsingen (divertido companheiro conhecido por Sidoca, irmão do Hugo), o Ivo Ferro e outros amigos, num total de dez ou doze pessoas. A Ilha das Cobras, que fica em mar alto, já fora presídio por algum tempo e, quando chegamos lá, um dos funcionários responsáveis pela manutenção do local nos contou que haviam encontrado um esqueleto humano quando fizeram uma escavação recente.

Uma história puxa outra e durante um bom tempo o bate-papo ficou limitado a causos de cadáveres, almas do outro mundo, fantasmas e coisas do gênero. E vieram as brincadeiras de que, à noite, as almas apareciam naquele dormitório enorme onde estávamos instalados.

Para surpresa nossa o Mário ficou apavorado e chegou à beira da histeria, quase tendo um chilique ao ouvir os ruídos da madrugada que por safadeza eram feitos pela própria turma, sob o comando do Moacir Amaral e do Sidoca. Ouviam-se batidas nas paredes, arrastar de pés, sacudir de galhos das árvores ao lado, até gemidos que vinham do lado de fora. Parecia o nosso “Teatro da Meia-noite”. E quando alguém xingava os supostos fantasmas o Mário, apavorado, repetia:

– Não brinquem com essas coisas! Não brinquem com essas coisas!

Em desespero, sem lembrar que o barco que nos levara havia partido e só voltaria no dia seguinte, ele queria sair imediatamente da ilha. Altas horas da madrugada o Gonzaguinha e eu tivemos que acalmar o Mário, pois ele estava realmente em pânico. Depois de muito tempo, tendo até rezado junto com ele, quisemos explicar que os ruídos estranhos foram feitos pelos seus companheiros e era tudo brincadeira. Aí piorou! Ele ficou doido de raiva, indo de cama em cama com pedaços de gelo nas mãos pra jogar na turma já cansada que tentava dormir. Só não deu briga porque éramos todos muito unidos, mas ninguém conseguiu dormir naquela noite”.

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Ubiratan Lustosa nos enviou este conto a propósito da crônica de ontem, quando sugerimos mandar para a Ilha das Cobras todas as figuras públicas condenadas ao ostracismo. Segundo Ubiratan, a ideia é boa, mas vai lotar depressa. E o mestre Cleto de Assis concorda em transformar a bela Ilha das Cobras num real ofidiário. Ou seja, o Butantã da corrupção.