Diários do Morubixaba

Muitos podem discordar de muitas coisas do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Só não podem deixar de reconhecer suas qualidades intelectuais e seu exuberante trato com a palavra. Falando ou escrevendo, FHC é um sedutor.

Prova disso são as 929 páginas de seus “Diários da presidência”, livro que acaba de sair, com a transcrição de seus relatos para um gravador do cotidiano de seus dois primeiros anos de governo: 1995-1996. Não há como não se encantar com a narrativa, principalmente para quem busca no nebuloso passado certas explicações para os absurdos presentes.

Quando agora Fernando Henrique se refere ao Congresso Nacional, por exemplo, não resta a menor dúvida de que ele sabe de quem está falando. Tem a ficha corrida dos principais atores dessa tragédia na memória. Eduardo Cunha é um deles, citado em seus diários: “Imagina! O Eduardo Cunha foi presidente da Telerj, nós o tiramos de lá no tempo de Itamar porque ele tinha feito trapalhadas, ele veio da época do Collor. Eu fiz sentir que conhecia a pessoa e que sabia que havia resistência, que eles estavam atribuindo ao Eduardo Jorge; eu disse que não era ele e que há, sim, problemas com esse nome. Enfim, não cedemos à nomeação”, contou FHC.

Também consta dos diários do Morubixaba um depoimento sobre a situação financeira de muitos homens públicos com a mesma cara de pau do Cunha: “Almocei ontem com o presidente do Banco do Brasil, (Paulo César) Ximenes, que me disse que há entre cem e duzentos deputados – mais para duzentos que pra cem – com o Cheque Ouro estourado, e muitos deles já fizeram composição e não pagam. Pior, há muitos ministros dos tribunais superiores na mesma situação. Isso é muito delicado e é uma desmoralização para as formas representativas e para o próprio Estado. No fundo a dívida é pequena, de 30 mil reais a 40 mil reais, mas vai se acumulando, com os juros elevados eles perdem o controle, ficam pendurados. É bastante dramático. No executivo também há alguns nessa situação, são coisas não podem ficar assim. Essas dívidas desmoralizam tudo, vamos ter que enfrentar o problema”.

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A agonia do Bamerindus é uma emocionante novela contada em dezenas de parágrafos aqui e ali. Depois eu conto, faltam menos de 100 páginas pra acabar de ler o catatau do Morubixaba.