Dia da consciência negra

O destaque dado há alguns anos sobre o teor supostamente racista da obra de Monteiro Lobato, o criador dos clássicos “O Sítio do Pica-pau amarelo” e “Urupês”, levantou o debate sobre a presença do negro na literatura. Na verdade, o negro, muito mais que um coadjuvante, é um doa maiores formadores da literatura brasileira.

Para começo de conversa, Machado de Assis, introdutor do realismo no Brasil e fundador da Academia Brasileira de Letras, não só era negro, como morava em uma favela e era gago. Dono de uma verve incrível, Machado ajudou a dar cara à produção literária do Brasil, buscando inspiração em Shakespeare para conceber seu maior clássico: “Dom Casmurro” – uma versão tupiniquim de “Otelo”. Ao que contam as lendas, Machadinho, como era chamado pelos amigos de sua época, que era epilético, doença que se agravou com a morte da esposa Carolina, conseguia controlar suas crises, chegando ao ponto de pedir licença, sair do local onde estava e retornar com a maior normalidade. Por mais que o fato nada tenha a ver com o fazer literário do autor, ele mostra a força de homem que lutou contra o preconceito, foi apadrinhado (no melhor sentido da palavra) por Manuel Antônio de Almeida, autor de “Memória de um Sargento Milícias” e se transformou no maior escritor brasileiro de todos os tempos.

Esse ano, a memória de Lima Barreto, autor de “Clara dos Anjos” e “O Triste Fim de Policarpo Quaresma”, foi reavivada em uma campanha para que o carioca fosse o homenageado da Feira Literária Internacional de Paraty (Flip) de 2014. O movimento, que contou com o apoio de gente do quilate da tradutora Denise Bottmann, não conseguiu o feito – Millôr Fernandes, morto ano passado, foi o escolhido pela Flip -, porém, trouxe à tona a vida e a obra de um dos maiores escritores brasileiros. Barreto, que era um homem de origem humilde, filho de pai alcoólatra enveredou pelo jornalismo e literatura para compor importantes escritos.

Lá fora, não dá para esquecer Toni Morrisson, escritora norte-americana, que recebeu em 1993 o Nobel por seu livro “Amada”. Independente, Morrisson se separou do marido e foi com os filhos para Nova York, onde começou a trabalhar em uma das maiores editoras do país. A Big Apple a ajudou a criar o enredo de “Jazz” e “Paraíso”, que completam a trilogia iniciada com “Amada”. Trocando em miúdos: imagine o que é uma mulher negra, separada e com filhos tentando a vida em Nova York.

A inglesa Zadie Smith, de origem negra, passou por menores percalços até ver seu nome estampado na capa de um livro. Dona de uma prosa fluente, que estabeleceu comparações com outros dois mestres da ficção, Ian McEwan e Jonathan Franzen, Zadie tem seu romance “NW”, lançado no ano passado e com previsão de sair por aqui em 2014, como um dos mais festejados da década.

O que se vê, portanto, é que não existem livros escritos por brancos ou negros; o que realmente há são livros bem ou mal escritos. E fim.