Crítica: “Maldito deus arrancando esses poemas da minha cabeça”, de Charles Bukowski

A poesia surgiu de repente para Bukowski (1920 – 1994) após ficar internado em um hospital, à beira da morte, Los Angeles. Naquele tempo os excessos já lhe eram cotidianos e, reza a lenda, que depois de receber uma transfusão sanguínea sua percepção mudou e foi invadido por uma calmaria que jamais experimentado – e que não deve ter durado tanto assim. Entre o real e o abstrato, Bukowski se tornou um dos poetas norte-americanos mais influentes do pós-guerra.

No Brasil, ele é cult, revelador, uma espécie de guru da transgressão. A publicação de sua obra por aqui ainda é restrita e por isso coletâneas como Maldito deus arrancando esses poemas da minha cabeça (7Letras, 300 págs., R$ 53,90) são tão importantes. Organizado e traduzido pelo poeta curitibano Fernando Koproski, o livro – junto com Essa loucura roubada que não desejo a ninguém a não ser a mim mesmo amém (2005) e Amor é tudo que nós dissemos que não era (2012) – fecha a trilogia do Velho Safado. “Era um sonho antigo”, comentou Koproski, primeiro brasileiro a verter o canadense Leonard Cohen para o português.

Os poemas estão divididos em quatro partes: “Nossos olhos transaram”, “A Maldição”, “As Nossas vidas um buquê de sangue” e “O Súbito clarão da palavra” – cada uma dedicada a um tema, começando pelo sexo & mulheres, indo à metalinguagem, depois Buk nos dá uma pitada de sua ideia de isolamento & angústia para então fechar com a sua visão ácida de uma sociedade consumista e egoísta. Apesar da divisão, o livro pode ser aberto aleatoriamente, como um oráculo e qualquer poema pode ser lido sem que nenhuma ordem seja infringida.

Poeta do cotidiano

Nascido na Alemanha com o nome de Henrich Karl Bukowski, não demorou muito para que simplificasse sua própria identidade e passasse a ser chamado de Charles. Dispensando todas as pompas da literatura, Bukowski sempre foi um defensor do cotidiano – quanto mais comum, mais ‘medíocre’, mais poético. A prova dos nove está em “correio ardente”, “um para o engraxate”, ou o libidinoso “a esposa fiel”.

 As musas do Velho Buk são como ele: gente comum, do povo. De quando em quando, ele cria uma figura imaginária, uma paixão que só existe sob seus próprios olhos. “poema para Brigitte Bardot” é uma homenagem sem resposta, muda; já “de vez em quando” é endereçado a uma mulher anônima que passou pelo poeta em uma rua. Não há rodeio, tudo é muito direto, conciso e sem concessões.

O tradutor deve viver

Koproski é um artesão da palavra e, sem dúvida, responsável por colocar parte dos poemas de Bukowski ao alcance do leitor brasileiro. Desde seu primeiro lançamento como tradutor do poeta norte-americano, Essa loucura roubada que não desejo a ninguém a não ser a mim mesmo amém, o curitibano tem trabalhado na voz do próprio autor, como se a poesia tivesse sido escrita em português.

Para compor o terceiro volume de poesia inédita do autor de Mulher, o Koproski garimpou livros póstumos ou ainda não visitados por ele enquanto. Obras raras por aqui – como Open all night: new poems (2000) ou Come on in! (2006) – têm seus representantes tupiniquins para deleite de quem ainda descobre o Buk ou já lhe é um velho conhecido.

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