NOTA: ★★★☆☆
Desde que a Disney percebeu que nostalgia também enche cofres, os live-actions se tornaram uma das maiores apostas do estúdio. A estratégia é clara: transformar animações clássicas em grandes produções cinematográficas, recheadas de efeitos visuais de ponta e rostos [ou vozes] conhecidos. Foi assim com O Rei Leão, A Bela e a Fera, Cinderella, Aladdin… e agora com Lilo & Stitch que, pelo menos até a metade do ano, tornou-se a maior bilheteria de 2025. O filme ultrapassou a marca de 1 bilhão de dólares no mundo, algo que nenhum outro título americano conseguiu até agora.
O que torna esse feito ainda mais curioso é que Lilo & Stitch nem havia sido pensado, inicialmente, para os cinemas. A produção estava prevista para ser lançada diretamente no Disney+, como um conteúdo original da plataforma. Mas conforme os testes de público foram animadores e os efeitos visuais mostraram um Stitch incrivelmente expressivo e carismático, os produtores viram uma oportunidade rara: trazer para a tela grande um filme que mistura nostalgia, apelo infantil e tecnologia de ponta. E funcionou. O público respondeu em peso.

Visualmente, o longa é um show, ainda que sem as cores e a energia do desenho original. Stitch continua sendo a alma do projeto, com sua personalidade anárquica, porralouca, impulsiva e irresistível. A dublagem original de Chris Sanders foi mantida, o que dá uma continuidade simbólica ao personagem. Os efeitos especiais, por sua vez, conseguem fazer com que o alienígena azul pareça real em meio aos cenários havaianos – uma fusão que poderia facilmente soar artificial, mas que aqui é executada com competência.
Entre os humanos, o maior destaque é Maia Kealoha, que interpreta Lilo com uma intensidade surpreendente para sua idade. A atriz consegue transmitir, com sutileza, o luto mal resolvido pela perda dos pais, o desejo por pertencimento e a rebeldia infantil que a torna tão autêntica. Sua relação com a irmã mais velha, Nani (vivida por Sydney Agudong), também tem força, especialmente nas cenas mais emocionais, onde o roteiro acerta em abordar conflitos familiares com delicadeza. A química entre Lilo e Stitch, essencial para o filme funcionar, está lá – e talvez seja o maior triunfo da produção.

No entanto, nem tudo é Ohana e calor tropical. Um dos maiores problemas da nova versão é a tentativa de suavizar ou infantilizar demais o conteúdo, simplificando a narrativa. O humor que, no original, era irônico, afiado e até melancólico em alguns momentos, aqui cede lugar a piadas físicas, tropeços, caretas e gags repetitivas. É um festival de cenas curtas, quase como esquetes, que se acumulam e enfraquecem a narrativa central. Em vez de uma trama que evolui organicamente, temos blocos de situações que pouco se conectam entre si.
Outro ponto que enfraquece o filme é a forma como alguns personagens foram redesenhados – tanto visual como narrativamente. O agente Cobra Bubbles, interpretado por Courtney B. Vance, é um exemplo claro: na animação, ele tinha presença, peso dramático e até certa complexidade. Aqui, parece uma participação especial esticada, sem impacto real na história. O mesmo vale para outras figuras coadjuvantes, que são diluídas em meio a uma trama que prioriza a fofura em vez do conflito.
Apesar dos tropeços, Lilo & Stitch cumpre bem o papel de entretenimento familiar. É bonito e tem seus momentos emocionantes, ainda que deturpe de forma bem complicada o conceito de família que era o cerne da obra original, principalmente por algumas decisões de certos personagens em sua conclusão.

Curiosamente, um dos melhores exemplos de como fazer um live-action funcionar veio justamente dos próprios criadores do Lilo & Stitch original. Dean DeBlois, e seu Como Treinar o Seu Dragão, mostrou como é possível copiar o enredo quadro a quadro sem perder a alma da história. Ainda que a versão com atores reais siga fielmente a animação da DreamWorks, ela acerta ao manter o tom emocional, a construção cuidadosa dos personagens e a relação simbólica entre menino e criatura. É um copia e cola que entende por que o original funcionou tão bem, e que não tem medo de apostar na sinceridade em vez de efeitos barulhentos ou piadas fáceis.
Até por isso, o que fica neste Lilo & Stitch é a sensação de que faltou coragem para recriar com liberdade e paixão. O diretor Dean Fleischer Camp entrega um trabalho seguro, mas sem alma. Um filme que agrada aos olhos, emociona nos minutos finais, mas que dificilmente será lembrado com o mesmo carinho que o original.
Serviço
Lilo & Stitch (2025)
Direção: Dean Fleischer Camp
Duração: 1h47
Elenco: Maia Kealoha, Sydney Agudong, Courtney B. Vance, Zach Galifianakis, Billy Magnussen
Em cartaz nos cinemas e, em breve, no Disney+
