Em 1993, Steven Spielberg mudou a história do cinema com Jurassic Park, adaptação do romance de Michael Crichton que combinava ciência, aventura e um deslumbre visual nunca antes visto. A famosa água tremendo no copo, o portão do parque se abrindo, a trilha de John Williams – tudo isso ficou na memória coletiva. Era o nascimento de uma franquia que faturaria bilhões e voltaria ao cinema por sete vezes ao longo de três décadas.
Agora, em Jurassic World: Recomeço, dirigido por Gareth Edwards (Godzilla, Rogue One), a própria existência do filme parece questionar se ainda há algo a ser dito – ou sentido – em relação aos dinossauros. O roteiro abraça essa dúvida como ponto de partida: os dinossauros não despertam mais fascínio, e vivem hoje exilados em uma zona remota do Equador, afastados da humanidade. A missão aqui é clara: tentar reviver o encantamento original. Mas o que se vê é um filme visualmente belo, sim, mas dramaticamente esvaziado – e, com o perdão do trocadilho, extinto em termos de impacto emocional.

A trama recicla ideias conhecidas da saga: uma grande indústria farmacêutica contrata um grupo de mercenários para coletar amostras de DNA de três dinossauros raros. O discurso é salvar vidas, claro. Mas os interesses, como sempre, são bem menos nobres. Scarlett Johansson interpreta a mercenária de bom coração; o astro em ascensão Jonathan Bailey vive o paleontólogo idealista que já virou marca na franquia; o premiado Mahershala Ali encarna o capitão com passado trágico. Os três são talentosos e carismáticos, mas a narrativa os protege com uma redoma de invulnerabilidade. E isso é fatal para a tensão do filme: sabemos desde o início que nenhum deles sofrerá dano real.
Desde Jurassic World (2015), que arrecadou mais de US$ 1,6 bilhão e trouxe o parque finalmente funcionando, o foco tem sido mais no espetáculo do que no suspense. Só que, sem personagens vulneráveis, o perigo perde o peso. Nem mesmo um sacrifício redentor – aquele momento clássico em blockbusters – se concretiza. Quando parece que alguém vai se oferecer por um bem maior, o roteiro recua. Os únicos que morrem são os figurantes cujo nome você nem tem tempo de gravar.

Como se não bastasse, o filme insere uma família genérica para tentar estabelecer alguma conexão emocional com o público. São tão rasos e deslocados que se tornam quase um peso morto narrativo – e a ideia de vê-los devorados não é exatamente um pensamento indesejável. Só que nem isso acontece. Em vez disso, temos o Tiranossauro Rex mais incompetente da franquia inteira. Um símbolo da saga reduzido a um coadjuvante atrapalhado, incapaz de ameaçar até mesmo um bote inflável.
A coisa é tão sem peso que você começa a prestar atenção em coisas aleatórias, como por exemplo a total falta de percepção dos personagens. Ninguém tem visão periférica, ninguém ouve passos de dinossauros de toneladas se aproximando. As criaturas surgem sempre do nada, como se tivessem aprendido a se esgueirar como ninjas – o que gera mais risos do que sustos. A falta de lógica interna mina até as boas ideias visuais que Edwards apresenta, que não são muitas, evidentemente.

Visualmente, o filme é um espetáculo. O diretor aposta em uma estética grandiosa, com florestas densas, neblina constante, rochas colossais e criaturas que impressionam, em uma pegada claramente inspirada no King Kong de Peter Jackson (2005). É exuberante do início ao fim. Mas, como já vimos em Jurassic Park III (2001), Reino Ameaçado (2018) e no problemático Domínio (2022), só a beleza não sustenta uma boa história. Sem tensão real ou profundidade dramática, o deslumbre visual acaba esvaziado.
Jurassic World: Recomeço já arrecadou mais de US$ 700 milhões nas bilheteiras globais – um feito respeitável. Mas o número, dessa vez, parece mais fruto da nostalgia do público do que do mérito do filme. O que deveria ser um novo começo para a franquia, soa mais como um último rugido cansado. O parque reabriu, mas a magia ficou trancada do lado de fora.
SERVIÇO
Filme: Jurassic World: Recomeço
Direção: Gareth Edwards
Elenco: Scarlett Johansson, Jonathan Bailey, Mahershala Ali
Duração: 2h14
Franquia: 7º filme da série Jurassic Park, iniciada em 1993
Bilheteria mundial estimada: + US$ 800 milhões
Classificação indicativa: 12 anos
