Homem com H é uma cinebiografia que pulsa na mesma frequência vibrante e desafiadora de Ney Matogrosso. Dirigido por Esmir Filho, o longa aposta na clássica estrutura de narrativa episódica para contar a trajetória de um dos maiores ícones da música brasileira. Mesmo sem fugir do convencional, o filme consegue capturar com brilho a intensidade e a liberdade criativa que sempre marcaram o artista, desde a juventude conflituosa até a consagração nos palcos.
Nascido em 1941, em Bela Vista (MS), Ney Matogrosso construiu uma das carreiras mais ousadas da música nacional. Sua voz inconfundível, suas performances andróginas e a capacidade de desafiar padrões logo o transformaram em símbolo de resistência nos anos 1970, quando surgiu à frente do grupo Secos & Molhados. O filme percorre justamente esses momentos-chave, como o rompimento com o pai conservador e a explosão de popularidade com o grupo que misturava poesia, rock e ousadia em plena ditadura militar.

O maior destaque do longa está na entrega de Jesuíta Barbosa. Embora sua atuação soe um pouco afetada no início, logo essa impressão se desfaz diante de uma performance visceral. Jesuíta parece incorporar Ney em cada olhar, gesto e provocação, com uma intensidade quase mediúnica. O resultado emociona e fascina, especialmente ao retratar os palcos, território onde Ney sempre se sentiu em casa – seja nos tempos dos Secos & Molhados ou na carreira solo.
A sexualidade do artista, parte indissociável de sua persona, é tratada com franqueza e naturalidade. As cenas de sexo, já alvo de críticas dos mais conservadores, fazem sentido no contexto de um artista que nunca se curvou diante das amarras da indústria, da censura ou da moralidade. Ney sempre se reinventou, transitando com liberdade entre gêneros musicais – do rock ao samba, da MPB ao pop – e desafiando rótulos com seus figurinos teatrais e a força de sua expressão corporal.

Ainda que a montagem se destaque por transições criativas e elipses sensíveis, há tropeços. Os personagens ao redor do protagonista surgem como satélites sem história própria, com exceção de figuras como Cazuza. E o desfecho recorre ao já batido recurso de encerrar com o próprio artista em um show atual, sem o impacto que sua trajetória merecia.
Apesar disso, Homem com H se firma como uma das cinebiografias mais marcantes do cinema nacional recente – um filme à altura de um artista que, aos mais de 80 anos, segue encantando plateias com seu magnetismo e sua coragem criativa.
Serviço
- Título: Homem com H
- Direção: Esmir Filho
- Elenco: Jesuíta Barbosa, Bruno Montaleone, Rômulo Braga, Hermila Guedes
- Duração: 129 minutos
- Em cartaz na Netflix
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