Obesidade e saúde nunca foram palavras sinônimas

Em todo o mundo, milhões de pessoas sofrem por excesso de peso. No Brasil, a obesidade, tanto infantil quanto adulta, já é considerada um problema de saúde pública. A vida cada vez mais sedentária e alimentação inadequada, bastante composta de produtos gordurosos e açúcar, são algumas das principais causas.

Foi-se o tempo em que uma pessoa gorda era considerada forte e cheia de saúde. No início do século XXI, a obesidade é vista com maus olhos pelos médicos, que a associam a uma série de enfermidades. Atualmente, no Brasil, cerca de 30 milhões de pessoas adultas sofrem por excesso de peso. Entre as causas do problema estão: fatores genéticos, metabólicos e comportamentais.

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), o excesso de peso corporal, em particular a obesidade, já tem sido considerada um problema de saúde pública no País, acarretando prejuízos aos pacientes, que incluem desde dificuldades respiratórias, problemas dermatológicos e distúrbios do aparelho locomotor até o favorecimento de enfermidades potencialmente letais como doenças cardiovasculares, diabetes não-insulino dependente (diabetes tipo 2) e mesmo certos tipos de câncer. Também pode causar desequilíbrio hormonal que, na mulher, pode levar à infertilidade por não permitir a captação de óvulos.

Porém, o que geralmente mais aflige os obesos é o preconceito. Não raro, eles são considerados incapazes de trabalhar, têm dificuldades para encontrar um par afetivo, abrem mão da vida social ou são obrigados a conviver com apelidos preconceituosos e agressivos, como “baleia”, “”rolha de poço”, entre outras. Muitos acabam abrindo mão de certos prazeres da vida, aderindo a dietas perigosas e mesmo precisando de apoio psicológico.

A cirurgiâ-dentista Reny Maura Munaretto, de 58 anos, que tem 1,60 metros de altura, atualmente pesa 59 Kg e mora em Curitiba, é um exemplo. Ela já pesou 88 Kg e conta que chegou a sentir rejeição pelo próprio corpo. “As pessoas não dizem que você está gorda, mas você sente pelo jeito que elas olham ou mesmo se comportam que há preconceito. Porém, no meu caso, o preconceito, antes de ser manifestado por terceiros, vinha de mim mesma. Sou muito vaidosa e, antes de emagrecer, sofri muito por não ter vontade de sair de casa e por não achar roupas que me servissem. Eu estava de mal comigo mesma e, por isso, perdia o bom humor por qualquer coisa. Arrumava briga com meus familiares e transferia meus problemas para os outros”, revela.

Já a autora do livro Não Perca Peso: Emagreça, Aparecida Delayt Bernardi Faulin, que vive em Bauru (SP), atualmente com 90 Kg, diz que sempre sofreu devido ao sobrepeso e, várias vezes, foi apontada como sendo “aquela gordinha”. Há alguns anos, ela pesava 120 Kg e revela que já chegou a ficar entalada em cadeiras, escorregador de crianças e mesmo ter dificuldades para passar em catracas de ônibus. “Tudo isso é bastante incômodo. Em certos momentos da vida, deixei de ir a festas e mesmo ao cinema por medo de passar por situações constrangedoras. Eu olhava para uma cadeira, conseguia me sentar, mas não sabia se conseguiria me levantar sem ficar presa”, lembra.

Durante muitos anos, Aparecida apelou a regimes milagrosos e mesmo medicamentos, que a levaram a uma forte depressão e à aquisição de gastrite. Só depois que passou por um programa de reeducação alimentar, ela conseguiu emagrecer. “Aprendi a comer de forma correta, abri mão de certos alimento e, de forma natural, comecei a perder peso. Com 120 Kg, eu calçava 42 e sempre precisa mandar fazer os meus sapatos. Meu pé era inchado e as lojas nunca tinham o meu número. Depois que emagreci, passei a calçar 39 e nunca mais tive dificuldades para comprar sapatos. A vida de uma pessoa obesa é bastante difícil” diz.

Adolescência

Entretanto, os maiores problemas e mesmo conflitos psicológicos parecem se manifestar na adolescência. A advogada Patrícia Araújo Trevisan, hoje com 25 anos, também moradora de Curitiba, conta que, nesta fase, sofreu bastante devido aos quilinhos a mais. “As minhas amigas usavam roupas justinhas e eu morria de inveja. Não encontrava nada que ficasse bem em mim. Deixava de sair de casa e tinha vergonha de ir à praia. Semanas antes de alguma festa, eu fazia dietas malucas. Ia ao evento mais magra e, dias depois, voltava a engordar” diz.

Com muita boa vontade e mudanças de hábitos de vida, Patrícia, que já pesou 85 Kg e atualmente pesa 65 Kg, conseguiu emagrecer. Hoje, ela cuida para que a filha, que tem um ano e três meses de idade, não passe pelos mesmos problemas. “Desde que ela nasceu, cuido para que ela tenha uma alimentação adequada. A incentivo a comer produtos saudáveis e evito que ela tenha acesso à chocolates, refrigerantes e gorduras. Não quero que ela enfrente os problemas que eu enfrentei”.

Crianças estão acima do peso

“A medida que a taxa de desnutrição cai, a taxa de obesidade aumenta. Atualmente, 30% das crianças brasileiras estão acima do peso. Nos estados do Sul, a obesidade infantil já começa a ser vista como um problema de saúde pública”. A informação é da médica endocrinologista pediátrica Julienne de Carvalho, que atende no Hospital Infantil Pequeno Príncipe, de Curitiba.

Segundo ela, a obesidade em crianças, assim como em adultos, é resultado da interação de fatores genéticos e ambientais. Nos últimos anos, a situação vem se agravando principalmente devido ao excesso de horas que as crianças passam em frente à televisão, ao vídeo-game ou ao computador, aliado à falta de atividades físicas. Muitos meninos e meninas, principalmente os que moram em apartamentos, acabam trocando brincadeiras que proporcionam o gasto de energia, como pega-pega, esconde-esconde e mesmo partidas de futebol e queimada, por desenhos animados e jogos eletrônicos.

A TV tem um agravante: através de anúncios publicitários, incentiva o consumo de alimentos ricos em gordura e açúcar. “Hoje em dia, grande parte das crianças brasileiras se alimentam muito mal. Elas substituem o arroz e o feijão, as frutas e as verduras, por salgadinhos, doces, refrigerantes e sanduíches altamente calóricos”, afirma Julienne. Também nas crianças, o excesso de peso pode gerar problemas psicológicos, sociais e orgânicos, como hipertensão, doenças cardiovasculares, aceleração da puberdade e aparecimento de diabete do tipo 2

Os medicamentos para tratamento da obesidade, atualmente disponíveis no mercado, ainda não foram suficientemente testados e aprovados para uso na população infantil. Sendo assim, os melhores resultados são obtidos com mudanças de hábitos alimentares associadas a exercícios físicos. “É muito difícil para uma criança resistir ao desejo de comer alimentos gordurosos e ricos em açúcar. Por isso, a criança em tratamento deve contar com total apoio da família”, revela a endocrinologista. “Todos devem passar a consumir alimentos mais saudáveis e evitar que a criança tenha acesso, principalmente na escola, a produtos com excesso de calorias”.

Controle

Só quem já enfrentou o problema sabe das dificuldades de manter uma criança em tratamento longe de doces, salgadinhos, batata-frita e refrigerantes. O operador de máquinas Nivaldo Aparecido Cirilio, pai de Douglas Nivaldo Cirilio, de 8 anos, é um exemplo. Seu filho já chegou a pesar 48Kg e teve que reaprender a se alimentar. “Em outubro do ano passado, procuramos ajuda de endocrinologista e nutricionista. Só então Douglas começou a fazer dieta. Até agora, ele já emagreceu 3 quilos”, afirma.

Segundo Nivaldo, antes de iniciar o tratamento, Douglas não tinha horário para comer. Ele comia uma coisa atrás da outra e o dia inteiro. Não resistia a bolachas recheadas, chocolates, frituras e salgadinhos. Por isso, a nutricionista passou um regime onde os horários de alimentação foram priorizados. Ele teve que cortar os lanchinhos entre as refeições e se habituar a comer produtos mais saudáveis. “Antes do início do tratamento, eu estava bastante preocupado, pois notava que meu filho engordava e começava a apresentar distúrbios de crescimento”.

No começo, Douglas teve problemas para se habituar aos regimes. O garoto ficava mal-humorado, tinha raiva das pessoas que lhe impediam de comer e não aceitava ter que trocar doces e frituras por alimentos menos calóricos e mais saudáveis. “Minha esposa e eu, assim como os médicos, tivemos que fazer todo um trabalho de conscientização com o Douglas. Explicamos para ele os motivos pelos quais ele tinha que perder peso e, na escola, conversamos com a professora para que ela ficasse de olho nele e nos ajudasse a controlar a alimentação. Em vez de dar dinheiro para que o Douglas comprasse lanches na cantina do colégio, ele passou a levar alimentos preparados em casa No começo, foi bastante difícil. Hoje, ele aceita bem a dieta e até fica orgulhoso quando consegue emagrecer sem remédios. Já está bastante consciente do problema, afirma. (CV)

Algumas evidências

– Cerca de 30 milhões de pessoas adultas estão acima do peso no Brasil. A maioria delas são mulheres.

– A prevalência de excesso de peso tende a aumentar com a idade, atingindo o maior valor entre os 45 e os 54 anos de idade.

– As menores prevalência de obesidade são encontradas na região Nordeste e as maiores na região Sudeste.

– As prevalências tendem a ser mais elevadas em populações de renda mais alta. Porém, particularmente entre a população feminina, a freqüência de excesso de peso é expressiva também entre as faixas de menor renda.

– Entre as mulheres pertencentes a faixas populacionais de menor poder aquisitivo, 30% delas apresentam algum grau de excesso de peso.

Fonte: Ministério da Saúde e Núcleo de Obesidade Mórbida de Curitiba.

Emagreça sem deixar de se alimentar bem

Engana-se quem pensa que emagrecer é sinônimo de fazer grandes sacrifícios e passar fome. Atualmente, mais do que remédios, dietas malucas e excesso de exercícios físicos, a reeducação alimentar parece ser a solução.

A sub-gerente do Programa do Vigilantes do Peso no Paraná, Vera Garcia, diz que uma pessoa, para perder peso, não precisa se privar do prazer de comer bem. Basta ter mais disciplina, adotar uma dieta equilibrada e estabelecer horários fixos para as refeições, comendo um número maior de vezes durante o dia, mas em quantidade menores. “A pessoa precisa ter boa vontade e estar disposta a mudar seus hábitos de vida. Porém, não precisa agredir seu organismo e se torturar para conseguir emagrecer”, diz.

Na maioria dos programas de reeducação alimentar, nenhum tipo de alimento é deixado de fora. Mesmo doces e produtos gordurosos, desde que em quantidades controladas, são permitidos.”É preciso conscientizar a pessoa de que estes produtos são altamentes calóricos e prejudiciais à saúde. Quem quer emagrecer é sempre aconselhado a deixá-los de fora da dieta alimentar, mas nunca proibido de comê-los”, explica.

O ritmo acelerado de vida da sociedade moderna contribui para que as pessoas se alimentem mal. A pressa faz com que os fast-foods e os alimentos industrializados ganhem cada vez mais espaço na mesa do brasileiro. “Com o tempo contado para o almoço, muitas pessoas acabam trocando o arroz e o feijão pelas pizzas, sanduíches e demais produtos comercializados em fast-foods. Outras, acabam substituindo o almoço por um pacote de salgadinho, biscoito ou mesmo um chocolate”, afirma Vera.

Segundo ela, qualidade de vida está intimamente ligada a uma boa alimentação. Sendo assim, se torna cada vez mais necessário que as pessoas encontrem um tempo para se preocupar com a comida que vão ingerir. Uma boa opção é, principalmente no horário de almoço, trocar os restaurantes fast-foods por aqueles que oferecem comida por quilo. Hoje em dia, há uma enorme quantidade destes estabelecimentos, que oferecem pratos variados, nutritivos e de boa qualidade. .Dizer que não se tem tempo para se preocupar com a alimentação não é mais desculpa. Com boa vontade e organização, acha-se tempo para tudo.

Após às 20 horas, o melhor é não ingerir mais alimentos sólidos. Porém, se a sensação de fome for grande, o melhor é optar por uma sopa leve.”A pessoa deve fazer mais refeições durante o dia para não sentir necessidade de comer à noite, quando o metabolismo se torna mais lento e as calorias não são gastas”, declara Vera. Comer à noite é um dos principais erros que uma pessoa que quer emagrecer ou mesmo manter o peso pode cometer. Sabemos que, à noite, as pessoas relaxam e acabam tentando aliviar as tensões do dia e a ansiedade através da comida. Mais uma vez, perseverança e reeducação são essenciais. (Cintia Végas)

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