Talvez seja ainda cedo para se comemorar, mas a Lei 11.705, de 19 de junho de 2008, a “Lei Seca”, está modificando o comportamento dos brasileiros, tornando-os mais responsáveis ao combinar bebida e direção.

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Pesquisa do Sistema de Monitoramento de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas Não Transmissíveis (Vigitel) do Ministério da Saúde, realizada por telefone, nos meses de julho e agosto de 2008, revelou que 32% deixaram de ingerir bebidas alcoólicas antes de dirigir.

De acordo com levantamento anterior, em 2007, a estimativa era a de que 150 mil motoristas bebiam e não temiam pegar no volante. Assim, nesses dois meses o comportamento mudou: 48 mil afirmaram que deixaram de beber e dirigir.

O resultado faz parte de um estudo amplo conduzido pelo Ministério da Saúde que permitirá mensurar o impacto da adoção da lei em todas as capitais. A comparação definitiva ocorrerá no fim deste ano, mas alguns dados já indicam mudança no comportamento do motorista brasileiro.

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“Há maior responsabilidade e essa aparente mudança pode ter sido motivada pelo debate ocorrido na sociedade a partir dos meios de comunicação sobre os riscos individual e coletivo de dirigir com teor alcoólico elevado, além da maior fiscalização das autoridades”, avalia Deborah Carvalho Malta, do Departamento de Análise de Situação de Saúde do Ministério da Saúde.

Revezamento

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José Carlos Salgado, proprietário do Zezitos Bar, acredita que nos primeiros meses da nova lei, a queda nas vendas de bebidas alcoólicas chegou a cair 30%. No entanto, aos poucos, o movimento voltou ao normal.

“O consumo voltou aos níveis anteriores, só que dá para perceber que os freqüentadores ficaram mais conscientes, ora se revezando na direção ora chamando um táxi para voltar para casa”, atesta.

Entre os “bebedores”, as opiniões ainda são contraditórias. A produtora de moda Regina Ventura, por exemplo, acha a lei um absurdo. “Tenho carteira há mais de dez anos e freqüento happy hours com os amigos duas vezes por semana, sempre tomo cerveja e nunca cometi nenhuma infração”, alega.

Por seu lado, Ângelo, representante comercial, não reclama da lei seca, reconhecendo que qualquer pessoa esclarecida sabe dos riscos que se corre em tomar “umas a mais”. “Sou a favor de todas as penalidades descritas na lei para que a segurança e a vida de outras pessoas não sejam comprometidas”, considera.

Mais abrangente

O primeiro levantamento nacional sobre padrões de consumo de álcool na população brasileira, realizado em 2007, mostrou que, na faixa etária de 18 a 34 anos, 40% bebiam em forma de binge. Ou seja, bebiam com maior risco, em curto espaço de tempo.

De acordo com a Secretaria Nacional Antidrogas, essa forma é a prática que mais deixa o jovem e o adolescente exposto a uma série de problemas de saúde e sociais, sendo o acidente de trânsito o mais comum, além de envolvimento em brigas, vandalismo e prática de sexo sem segurança. O mesmo levantamento revelou ainda que metade daqueles que beberam em forma binge, o fizeram pelo menos uma vez por semana.

Para o presidente da Associação Médica Brasileira, José Luiz Gomes do Amaral, a legislação veio para ficar e a sociedade, como um todo deve lutar por sua consolidação.

“No começo, pode ter havido certos exageros, pois é preciso respeitar um nível de tolerância, ocasionado por imprecisão dos equipamentos, mas a decisão do governo é extremamente positiva”, avalia.

O dirigente acredita, ainda, que a legislação poderia ser mais abrangente, proibindo definitivamente a publicidade sobre o álcool, que, no seu entender, tiraria o “glamour” do consumo de bebidas e, conseqüentemente, faria diminuir os índices de alcoolismo entre a população. “Principalmente entre os mais jovens, já que a eles começam a beber cada vez mais cedo”, completa.

Alto custo

Em 2006, o Brasil contabilizou 35.155 mortes por acidentes de transporte terrestre. Os homens totalizaram 28.670 (82%) contra 6.475 (18%) de mulheres vítimas.

Entre os homens, a maior concentração de óbitos se deu na faixa etária de 15 a 59 anos (83,1%). As mulheres representaram 67,2% das mortes nessa mesma faixa de idade.

De acordo com estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), os custos dos acidentes de transporte nas rodovias brasileiras chegam a R$ 24,6 bilhões e, nos aglomerados urbanos, somam R$ 3,6 bilhões.

Nesses valores, estão incluídos os gastos com cuidados em saúde, perda de produção, danos aos veículos e outros prejuízos. Para a médica Deborah ÈMalta, a provável mudança de comportamento dos brasileiros, revelada na pesquisa preliminar do Vigitel, reforça o quanto é importante manter em alta as campanhas contra o consumo de bebidas antes de dirigir e o rigor da fiscalização nas vias públicas contra os infratores.