Férias: Longe das escolas, perto dos acidentes domésticos

O mais novo enfiou o dedo na tomada e levou um choque, a menina se engasgou com um pedaço de pão, o mais irrequieto, ao tentar pular o muro, caiu e quebrou o braço. Chegaram as férias, aquele período em que as crianças ficam longe das escolas, perto dos acidentes domésticos. Elas nem começaram direito, mas a família Sampaio já passou por todos esses contratempos. Todo cuidado é pouco, afinal, apesar de serem previsíveis ou passíveis de prevenção, os acidentes domésticos são a principal causa externa de mortalidade em crianças com idade de 1 a 14 anos.

Esses "acidentes" não ocorrem por acaso nem são produtos da fatalidade, pois existe, sempre, um fator de risco que poderia ser prevenido. Especialistas atestam que cerca de 80% dos casos de acidentes com crianças poderia ser evitado. Segundo Eliane Mara Cesário Pereira Maluf, presidente da Sociedade Paranaense de Pediatria, é inadmissível que a nossa sociedade continue a tolerar e a assistir passivamente a disseminação do que ela chama de uma verdadeira "epidemia silenciosa", os acidentes pediátricos.

Sem noção do perigo

A neuropediatra Lúcia Helena Coutinho dos Santos, professora do Departamento de Pediatria da Universidade Federal do Paraná, diz que a criança, pela sua falta de noção do perigo, curiosidade ou controle motor em desenvolvimento, está sujeita freqüentemente ao risco de sofrer acidentes. Ela esclarece que essas características predominam nos acidentes conforme o desenvolvimento infantil (ver quadro). Autora de um estudo realizado em Curitiba, a médica sugere que a avaliação epidemiológica dos acidentes seja feito em cada cidade do país. "Assim poderemos definir maneiras de prevenção efetiva, atendendo as particularidades e os hábitos de cada região", defende.

O crescente número de casos mostra a desinformação dos pais sobre os riscos a que uma criança está sujeita dentro e fora de casa e, também, que os atos de violência podem ocorrer em qualquer idade. Além disso, em seu estudo, ela constatou que o fator socio econômico e a possibilidade de maior acesso à informação não eliminam os riscos de acidentes e de atos de violência: eles acontecem em qualquer classe social. Lúcia Helena aponta uma boa educação e o conhecimento das causas básicas que geram tantos acidentes como ações que minimizarão essa epidemia.

A prevenção dos acidentes é fácil e deve se tornar prioritária. No entanto, os números desses "acidentes" apontam para um crescente número de mortes e seqüelas graves. Dentre os principais fatores de risco de trauma infantil domiciliar destacam-se a utilização de móveis inapropriados; fiação elétrica desprotegida; brinquedos impróprios para a idade; fogões, fornos, panelas e talheres com fácil acesso; escadas sem proteção; e a presença da criança nos banheiros sem a devida vigilância. Soma-se a isso o descuido com armas de fogo e o comportamento violento de pessoas adultas que colocam em risco a saúde das crianças.

Cada idade tem o seu risco

A maioria dos acidentes ocorre porque se subestima a capacidade das crianças e se desconhecem as etapas de seu desenvolvimento psicomotor. Abaixo, as características que favorecem a ocorrência de acidentes em cada fase da vida infantil.

A idade frágil (de um a seis meses)

Nessa idade a criança pode começar a rolar, por isso não deve ser deixada sozinha em lugar alto. Berços, camas e sofás devem contar com grades de proteção.

A idade da curiosidade (de sete a doze meses)

Agora a criança começa a "querer" ficar em pé, existindo a possibilidade do deslocamento do corpo no espaço. A maior preocupação é protegê-la contra as quedas.

A idade da aventura (de um a dois anos)

A idade em que a criança explora o mundo pelo rastejamento. Inicia a exploração de espaços e objetos domiciliares. Para sua segurança devemos manter grades nas janelas, portões no topo das escadas e telas bem fixadas.

A idade da independência (dois a três anos)

As experiências se ampliam com uma maior capacidade motora. Ela sobe nos móveis e começa a ter maior controle pessoal e a deslocar-se com mais desenvoltura. Ainda não tem noção do perigo. Como imita os pais, estes devem ensinar-lhe noções de segurança mostrando os perigos da rua.

A idade da experiência (três a cinco anos)

Nessa fase a criança começa a explorar a vizinhança e a andar fora de casa. Gosta de jogar bola, subir em árvores, andar em pequenas bicicletas. Os pais devem supervisionar o local em que ela brinca, removendo tudo que represente perigo. É uma boa idade para ensinar as regras de segurança e a maneira adequada de segurar os utensílios.

Por volta dos sete anos

A criança ainda tem alguma dificuldade sobre noções de distância e existe uma tendência à distração e ao comportamento imprevisível. Passa boa parte do tempo envolvida com brincadeiras ao ar livre, e, por conseqüência, mais tempo exposta a um possível trauma.

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