Complexo à base de alho combate efeitos colaterais da quimioterapia

Brasília

– De acordo com o Instituto Nacional do Câncer (Inca), órgão vinculado ao Ministério da Saúde, estima-se que, anualmente, são diagnosticados no Brasil 269 mil casos da doença e registradas 108 mil mortes pela enfermidade. Em busca de medicamentos com atividades antitumorais para combater o mal, um grupo de pesquisadores do Instituto de Química (IQ) da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp), campus de Araraquara, coordenado pelo químico Antonio Carlos Massabni, estuda complexos que contêm substâncias de origem natural. “Nossa mais recente descoberta é um composto resultante da combinação de um aminoácido extraído do alho com o metal paládio. O composto, que pode ser diluido em solução aquosa em baixa concentração, impediu o crescimento de células tumorais HeLa, de câncer cervical humano, em testes “in vitro””, diz Massabni.

O novo produto químico, em fase de patenteamento, foi aplicado às células tumorais HeLa por um período de nove dias. Os testes mostraram que quanto maior a concentração do composto, maior a sua capacidade no combate às células tumorais. “Na concentração de 43 microgramas por mililitro do novo complexo de paládio, o crescimento das células tumorais foi de apenas 30% em relação ao crescimento obtido sem o referido composto, enquanto na concentração de 170 microgramas/mililitro, o crescimento das células tumorais foi completamente bloqueado”, conta Massabni.

Em concentrações superiores a esta, o produto se mostrou eficiente tanto no que diz respeito à interrupção do crescimento das células tumorais, quanto a sua capacidade de “matar” as células tumorais já crescidas, como ocorre nos tumores. Os testes, realizados na Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da Unesp, sob a responsabilidade do pesquisador Cláudio Miguel da Costa Neto, entusiasmaram os cientistas, pois os níveis de concentração são muito baixos. “A grande diferença deste novo produto em relação a outros”, destaca Massabni, “é que ele contém em sua fórmula um aminoácido de origem natural, extraído do alho”.

Exatamente por ter sua origem numa fonte natural, o produto pode ter chances de ser mais bem aceito pelo organismo, reduzindo os efeitos colaterais causados pelos atuais quimioterápicos, que utilizam substâncias sintéticas produzidas em laboratório. “O fato de ser solúvel em água e estável em pH fisiológico pode facilitar também a aplicação do composto e permitir sua distribuição por todo o corpo humano”, diz um dos responsáveis pelo estudo, o químico Pedro Paulo Corbi, que realiza seu doutoramento no IQ.

O uso de compostos metálicos no tratamento do câncer não é novidade. O primeiro deles, a cisplatina, foi concebido à base da platina, em 1964, mas liberado para aplicação clínica apenas em 1978. A partir de então, vários compostos metálicos vêm sendo produzidos para o tratamento do câncer. “O composto com o qual trabalhamos é derivado de outro metal, do mesmo grupo da platina, que é o paládio”, explica Massabni. “Esta substância apresenta, neste momento, um grande potencial para ser empregada no tratamento do câncer. Este novo produto, ainda não testado em animais, pode vir a ser menos agressivo, mas tão eficiente quanto as drogas atuais.”

Novos compostos

O mesmo grupo do IQ do campus de Araraquara, que estuda o composto à base de um aminoácido do alho contra o câncer também testa outras substâncias que podem ser opção para controlar a concentração de metais pesados no organismo e como agentes bactericidas. O químico Alexandre Cuin, doutorando do IQ, verificou que compostos de prata com ácidos alfa-hidroxicarboxílicos encontrados em frutas cítricas têm se revelado ótimos agentes bactericidas. A pesquisa também indica que derivados dos alfa-hidroxiácidos com chumbo apresentam grande potencial no tratamento de intoxicação por metais pesados. “Outra vantagem é que os complexos conseguidos são solúveis em água e podem ser eliminados pela urina”, garante.

Como os atuais medicamentos para a eliminação de chumbo, como o EDTA, reconhecidamente apresentam vários efeitos colaterais, como a descalcificação e a anemia, os pesquisadores acreditam que produtos de origem natural, como os aminoácidos e os ácidos alfa-hidroxicarboxílicos, também neste caso, podem reduzir a agressividade contra o organismo. “Estamos estudando também complexos químicos que contêm adoçantes associados a metais como cobre, níquel e prata. Os complexos com prata têm ação bactericida”, conta o também químico Maurício Cavicchioli, igualmente doutorando no IQ.

Responsável pelos testes com as micobactérias, a pesquisadora Clarisse Queico Fujimura Leite, da FCF também do campus de Araraquara, afirma que testes de um complexo de prata associado a um conhecido adoçante deram ótimos resultados “in vitro” na inibição da reprodução de micobactérias altamente resistentes. “Entre elas, a do bacilo da tuberculose”, diz. Este processo, em fase de patenteado no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi), conta ainda com a participação do professor Petr Melnikov, da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS).

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