Avaliação social do dependente químico

A avaliação social em dependências químicas é, na maioria das vezes, a porta de entrada do dependente para o tratamento, à exceção daqueles que procuram ou são levados diretamente a um serviço médico. Em geral, o abuso ou a dependência de drogas são camuflados por inúmeros sintomas de dificuldades sociais, cuja natureza é vista pela sociedade como problemas de comportamento ou de destino do usuário.

Como o processo de abuso ou o estabelecimento da dependência não ocorrem em etapas temporais claramente definidas, é natural que, à princípio, não se perceba nada de anormal no comportamento do usuário. Pais, empregadores, colegas, cônjuges, familiares e amigos encaram com naturalidade certos episódios de esquisitices. Com o passar do tempo, observando o comportamento da pessoa, nota-se que esquisitices, variações de humor e atitudes inusitadas passam a ocorrer com maior freqüência. As pessoas mais próximas percebem que algo errado está ocorrendo, porém, não conseguem explicar. O que sentem é que aquele indivíduo está passando por uma transformação.

Problemas de toda a ordem começam a aparecer. Bom filho torna-se desrespeitoso com os pais e já não cumpre suas responsabilidades para com a escola. A esposa já não reconhece naquele homem com quem partilha a vida há anos a pessoa com quem se casou. Chefe busca com afinco as razões para as ausências e o desleixo por parte daquele empregado que, até pouco tempo, era competente e responsável.

Explicações de toda ordem são utilizadas para compreender o que se passa. Todavia, a possibilidade de associação de tais alterações com o consumo de drogas é desconsiderada ou minimizada pela utilização de mecanismos de defesa. A evolução do quadro do usuário e sua visível deterioração pessoal fazem com que as pessoas próximas entrem em ansiedade quanto à necessidade de se fazer alguma coisa. Desorientadas, experimentam sentimentos ambivalentes que se traduzem em ações contraditórias de proteção e exclusão. É este quadro, em que a vida da pessoa se apresenta como o borrão de uma obra de um pintor impressionista, que o profissional vai encontrar ao receber para atendimento um usuário abusivo ou dependente de drogas.

Então, trabalhar é preciso! Mesmo que já exista ou que no primeiro momento do atendimento se faça um diagnóstico médico, é fundamental considerar aquele paciente não apenas como um ser biológico, mas, eminentemente, um ser social, cuja rede de interação foi destroçada no período de ingestão da droga.

É preciso ordenar o casos. Este ser humano deve, no primeiro atendimento, sentir-se acolhido pelo profissional que, neste instante, representa a alternativa real de mudança na sua vida. O profissional, então, deve assumir uma postura que transmita esperança. Não em solução mágica e, sim, na possibilidade de ali estar se estabelecendo uma parceria para um árduo, mas produtivo trabalho de recuperação do paciente.

Este é o primeiro momento da Avaliação Social. É quando o profissional, diante do caos aparente em que está a vida do paciente, consegue fazer junto com ele uma leitura positiva de toda a sua situação, concluindo que, o trabalho a ser feito “é difícil, mas é possível”, diferente de “é possível, mas é difícil.”

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Paulinha do Carmo Arruda Vieira Duarte

é diretora do Centro de Atenção às Drogas e coordenadora do Curso de Especialização em Dependências Químicas da Pontifícia Universidade Católica do Paraná.

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