Psicoacústica ajuda indústrias a reverter ruídos em sons agradáveis

Brasília – Não é de hoje que indústrias e autoridades governamentais se preocupam com a qualidade sonora dos eletrodomésticos, automóveis, brinquedos, equipamentos e máquinas produzidas no país. Mas nos últimos anos, isso deixou de ser apenas uma preocupação para se transformar em importante diferencial de competitividade num mercado globalizado que, cada vez mais, exige qualidade, eficiência e conforto auditivo dos produtos utilizados no dia-a-dia.

Com isso, geladeira, máquina de lavar, ar-condicionado, liquidificador e até secador de cabelos, entre outros eletrodomésticos, vêm recebendo tratamento especial dos fabricantes com a ajuda de universidades, instituições e centros de pesquisa que trabalham com a psicoacústica – ciência que associa a psicologia com a percepção auditiva, na busca da chamada qualidade sonora.

Como a capacidade para ouvir sons varia bastante de pessoa para pessoa, a psicoacústica quantifica as sensações auditivas de volume, som (mais ou menos agudo) e aspereza para torná-lo mais agradável. Em adulto normal, os limites de audibilidade situam-se em torno de 16 Hz para as baixas freqüências (graves) e por volta de 16.000 Hz para as altas freqüências (agudos). Ou seja, nossa audição distingue sons do grave ao agudo na faixa de 16 Hz a 16 Khz.

Em 1994, o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) instituiu o Programa Nacional de Educação e Controle da Poluição Sonora e criou um “selo ruído” para identificar a potência sonora dos eletrodomésticos, facultando ao consumidor a opção pelos produtos que sejam menos ruidosos. De lá pra cá, os fabricantes nacionais adotaram materiais e dispositivos de alta tecnologia concebidos pela engenharia acústica para eliminar ou reduzir os ruídos por meio da absorção ou isolamento acústico.

Relacionar a percepção auditiva com as sensações e emoções do homem é uma preocupação constante para o aperfeiçoamento da qualidade acústica dos equipamentos. No caso do ar-condicionado, por exemplo, a utilização de espumas no formato de mamilos aumentou a área de absorção acústica, impedindo que o som emitido seja refletido nas superfícies do equipamento. Resultado: o aparelho ficou mais silencioso e auditivamente mais agradável.

Os barulhentos brinquedos eletrônicos também estão ficando mais silenciosos. Entre os requisitos que a criança lista para um brinquedo é que ele faça barulho. Quanto mais barulho melhor, mas a própria indústria já reconhece que muitos produtos excedem o volume seguro do sistema auditivo infantil. Segundo os especialistas, acima de 80 decibéis (dB’s), valor equivalente ao barulho de um secador de cabelos, o ruído já passa a ser nocivo para as crianças. Porém, não é raro encontrar brinquedos nacionais e importados que produzem sons de até 106 decibéis.

Na indústria automobilística, existe uma área da engenharia que cuida exclusivamente do controle de ruídos e vibrações no interior dos veículos. É a acústica automotiva, responsável pela aferição de sons e pelo tratamento interno do barulho produzido pelos equipamentos e peças. Antes de lançar qualquer modelo, as montadoras fazem uma série de testes e simulações para medir a quantidade de ruído e vibrações produzidas pelo automóvel. Tudo isso para tornar o produto mais agradável, uma vez que ruído e vibração estão diretamente relacionados ao conforto.

O ruído externo produzido por veículos automotivos é regulamentado pelo Conama e não pode ultrapassar o limite máximo de 77 dB’s para automóveis, 80 dB?s para motos e 84 dB?s para caminhões e ônibus.


O avião é um excelente exemplo da importância do isolamento acústico como gerador de conforto sonoro. O ruído emitido na decolagem de um avião a jato é de 140 dB?s – o limiar da dor começa em 120 dB?s, equivalente a um motor de Fórmula 1. Sem o isolamento acústico composto por várias camadas de materiais isolantes instalados sob a estrutura metálica, o som seria insuportável para os passageiros e poderia provocar milhões de casos de surdez.

Seja em eletrodomésticos, automóveis, máquinas ou motores, o ruído não precisa ser necessariamente baixo, mas agradável. Por isso, quando um som desagradável é captado em qualquer produto pode-se utilizar diversos materiais de isolamento como espumas, fibras de vidro, mantas e câmera de ar para remover aquela faixa de freqüência ou até mesmo aumentar o ruído de outra faixa para encobrir aquela que desagrada. Tudo isso para atingir a meta do conforto sonoro.

O mascaramento do ruído desagradável está relacionado com a resolução sonora que nosso sistema auditivo é capaz de discernir. Se dois estímulos sonoros muito similares forem emitidos quase ao mesmo tempo, o cérebro provavelmente irá reconhecê-los como um só. Isso também é explicado pela psicoacústica.

Em Brasília, a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (Fau) da UnB desenvolveu placas de absorção sonora feitas de fibras vegetais e papel reciclado para serem instaladas em estúdios, hospitais e salas de aula, locais onde a reverberação do som prejudica o conforto sonoro do ambiente. A mistura de fibra de bananeira cozida em água e soda cáustica, polpa de papel e um componente aerante responsável pela formação de bolhas de ar, alcançou índices de absorção entre 60% e 90% para freqüências médias ou altas.

O Departamento de Mecânica Computacional e Vibroacústica da Faculdade de Engenharia Mecânica (Fem) da Unicamp desenvolve vários projetos que visam melhorar desde instrumentos musicais até o nível de ruído no interior de veículos e aeronaves, incluindo brinquedos e eletrodomésticos.

Recentemente, o Laboratório de Integração e Testes (Lit) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em São Joisé dos Campos (SP), inaugurou uma Câmara Reverberante capaz de simular em laboratório o ambiente acústico produzido por motores de avião modelo Boeing. A câmara também pode gerar ambientes acústicos específicos para a avaliação do desempenho de materiais isolantes utilizados pelas indústrias automobilísticas e de eletrodomésticos da chamada linha branca.

O controle de ruídos das máquinas e equipamentos passou a ser tão importante, que o processo requer a troca efetiva de informação acústica entre fabricantes, pesquisadores, instaladores e usuários. O ideal é que os eletrodomésticos gerem ruídos na faixa de até 30 dB?s, nível um pouco superior aos 20 dB?s de uma conversação em voz baixa e bem inferior a média de 45 dB?s registrada no interior de residências de grandes cidades.

A tecnologia desenvolvida buscando o conforto sonoro também é muito empregada no tratamento de insônia, ansiedade, depressão e outros distúrbios. Como este conforto está diretamente relacionado à reação do organismo humano aos sons, dependendo do estímulo sonoro, o cérebro pode produzir a ilusão de freqüências abaixo do espectro auditivo provocando uma sensação de total relaxamento.

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