Lenda Viva

Jackson era referência no maravilhoso Atlético de 1949

O filho do agente de navegação José Thomaz do Nascimento começou a jogar bola com 5 anos de idade, em 1924. No princípio, usava bolas de meia e depois bexigas de porco cheias de serragem. No primeiro Natal, depois disso, ganhou de presente uma bola de couro. “Desde os cinco anos de idade o meu presente de Natal era uma bola. O bico ficava para fora, a gente tinha que enfiar para dentro e depois de algumas partidas, a bola ficava toda torta”, recorda, hoje aos 89 anos, Jackson Nascimento, um dos jogadores históricos do Clube Atlético Paranaense e que fez fama em São Paulo em 1950 e 1951 jogando pelo Sport Clube Corinthians Paulista.

Até hoje as bandeiras, camisas, faixas de campeão, medalhas e muitas fotografias dos dois times decoram as paredes do escritório de seu belo e amplo apartamento no bairro Água Verde, onde, aposentado desde 1981 do cargo de procurador da República, mora com a mulher. Afinal, Jackson foi campeão pelos dois times: em 1945 e 1949, pelo Atlético; em 1951 e 1952, pelo Corinthians, além de ser artilheiro do campeonato paranaense pelo Rubro-Negro em 1953, com 21 gols. No clube paranaense Jackson marcou 140 gols, um dos maiores artilheiros da história do Atlético. Entre 1959 e 1968 foi diretor técnico e administrativo do clube da Baixada.

O meia-esquerda Jackson foi um dos principais nomes do esquadrão de 1949, que ganhou o nome de Furacão, apelido que ainda hoje serve para denominar o rubro-negro da Baixada. Ele frequentou dois cursos universitários, de Engenharia e o segundo de Direito, ambos na Universidade Federal do Paraná. Ele se formou no primeiro em 1946 e no segundo em 1951. E se muitos jogadores têm uma coleção de dramas e tragédias em suas vidas, a vida de Jackson foi tranquila, provavelmente porque teve um ambiente doméstico privilegiado.

O primeiro clube de Jackson foi um time de Antonina chamado 29 de Março. “Meu pai virou diretor do Clube Atlético Antoninense e me levou para lá. Eu jogava de meia-direita ao lado de meu irmão Valter, que era ponta direita. Todo mundo dizia que eu jogava bem. Assim, quando eu vim para Curitiba, como meu pai era atleticano, foi até natural jogar nas categorias de base do Clube Atlético Paranaense. Eu vim para Curitiba para estudar no Liceu Rio Branco”, diz ele. Ele começou no time juvenil do Atlético, foi para o aspirante e em 1944 já estava no titular. “Com 17 anos estava jogando no time adulto. Só que aí passei a jogar de meia-esquerda”, diz ele. Em 1944 virou jogador profissional, formando com Cireno uma das melhores duplas ofensivas que o futebol paranaense conheceu.

“O gol mais importante”

O gol mais importante da minha vida aconteceu no dia 6 de junho de 1954. Num empate de 2 gols contra o Coritiba, no Belfort Duarte. Eu tinha voltado de Londrina e fui jogar no Atlético. Tinha parado dois anos com o futebol e a torcida do Coritiba estava vaiando, coisa que toda torcida faz. O pessoal gritava: ‘Aí refugo do Corinthians!’ Aquilo acontecia o jogo inteiro. Tinha chovido e a bola estava molhada. O Coritiba ganhava por 2 x 0 no 1.º tempo. Aos 30 do 2.º, Boluca fez o primeiro do Atlético. E quando o jogo chegou aos 45 minutos, eu peguei a bola, dei um chute forte e ela entrou. A torcida do Coritiba já comemorava o triunfo. Eu fui para a torcida do Coritiba, tirei a chuteira, botei no ombro e fiquei limpando ela. Em seguida, o jogo terminou e sai com as chuteiras no ombro e fui para os vestiários embaixo da torcida do Coritiba. Ninguém disse nada.”

No Corinthians

“Eu fui para o Corinthians porque em 1950, quando teve a inauguração da fábrica de papel em Monte Alegre, um diretor da empresa, que era torcedor do Corinthans, chamou o Atlético para fazer uma partida amistosa. Nós fomos lá e empatamos em 3 gols. Eu fiz os três gols do Atlético. O Cláudio, que era o capitão do Corinthians, o Nilson e o Servilho disseram: ‘Temos que levar este jogador para São Paulo’. Aí, teve uma segunda partida em Curitiba e nós ganhamos de 5 x 2. Eu fiz dois. Eles disseram mais uma vez, que tinha que me levar. E eu fui em agosto de 1950. Fui meio preocupado, porque o Corinthians não ganhava nada fazia tempo. Fazia uns 12 anos. E tinha um diretor lá que queria matar todo mundo, porque o time não estava ganhando nada. E aí eu pensei, eu vou pra lá pra morrer? Mas eu decidi ir. Eu ganhava 400 cruzeiros no Atlético. E fui ganhando 12 mil cruzeiros. Para mim era um dinheirão. Mas nunca fui bom de negócio. Achava que aquilo era muito. Depois me disseram que eu podia ter pedido uma casa e um carro, que o pessoal teria atendido. Mas eu não fiz isso.”

Remédio

“Podem falar o que quiser, mas três coisas que não combinam com futebol: mulher, cachaça e balada. O Ronaldinho é bom, mas como confiar num cara deste? Jogador tem que ser como o Messi. É o maior do mundo. Não se mete em confusão, cuida da vida dele e a carreira vai ser longa, porque joga bem e cuida dela. O jogador tem que ter prazer para jogar futebol. Quando eu jogava eu achava que o futebol era um remédio. Era bom para mim. Meu pai podia me sustentar, eu não precisava jogar futebol para ganhar dinheiro, eu jogava porque gostava e sentia prazer nisso. Hoje em dia, o cara joga alguns anos e você vai olhar para ele, está cadavérico. O sujeito vai para a balada, toma cachaça, se envolve com mulheres da noite. Aí ele chega para treinar o preparador físico joga uma carga de exercícios que o corpo dele não suporta. O cara não aguenta. Por isso que muitos caras estão velhos com 30 anos.”