Dívidas

Não existe milagre para reduzir as parcelas de financiamento

“Reduza em até 75% a parcela de financiamento”. A promessa tentadora estampa um panfleto distribuído nas ruas da cidade. É apenas uma das muitas propostas espalhadas em cartazes e impressos que prometem de 30 a 75% de redução nas parcelas de financiamentos, especialmente de veículos. Mas será que esses serviços realmente cumprem o que prometem? Especialistas advertem que não existe milagre.

As parcelas de financiamento podem comprometer boa parte da renda familiar, o que, em caso de alguma eventualidade, pode levar ao atraso no pagamento – e isso vai gerar juros ainda mais altos, numa “bola de neve” que poderá tornar a dívida impagável. Dados do Banco Central apontam que a inadimplência no financiamento de veículos em junho foi de 6,1%, isto é, pelo menos seis pessoas em cada cem não estão conseguindo honrar o compromisso. É por isso que a chance de diminuir expressivamente as parcelas pode atrair grande número de devedores.

Uma dessas empresas consultada pelo Paraná Online informa que pode diminuir em 40% o valor das parcelas – a simulação seria feita de graça após o envio dos dados por e-mail e então seria informado o valor a ser pago pelos honorários do advogado que faria a chamada ação revisional. A ação é o instrumento jurídico para a revisão dos contratos de financiamento, leasing, consórcio, entre outros, com o objetivo de reduzir as parcelas pagas pelos consumidores.

Saldo devedor

Outra empresa promete reduzir de 30% a 70% o pagamento mensal do financiamento. O cálculo também é feito gratuitamente, mas é preciso levar os documentos pessoalmente até a empresa. O valor a ser pago pelo serviço varia conforme o contrato. Uma terceira empresa informa que desde janeiro não trabalha mais com a renegociação das parcelas – pode apenas reduzir o saldo devedor em até 80%.

Processo é complicado

A advogada Andressa Jarletti, especialista em direito do consumidor, explica que a revisão não é mais um processo fácil. “Virou um dos processos mais complicados, pois no final do ano passado o Superior Tribunal de Justiça (STJ) impôs série de limites para trabalhar essa revisão, impedindo que os consumidores questionem os contratos”, afirma. “Como milhões de processos foram ajuizados sobre isso, houve lobby muito grande por parte das instituições financeiras para limitar esses pedidos”.

Segundo Andressa, antes da decisão do STJ as ações para redução de parcelas normalmente tinham resultado positivo por causa dos juros com capitalização e uma série de tarifas injustificadas cobradas pelas instituições em grande parte dos contratos.

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Entre as irregularidades cometidas pelos anúncios que prometem a redução das parcelas, Andressa aponta que escritórios de advocacia não podem fazer propaganda. “Escritórios de advocacia não podem fazer anúncio porque não é comércio”. Além disso, segundo ela, “advogado nunca pode garantir resultado, porque depende de uma série de fatores, como o caso particular, o juiz, entre outros”.

Andressa comenta ainda que em muitas empresas não existem profissionais preparados para resolver os processos. “Existem empresas de fachada que captam milhares de clientes para advogados recém-formados, que podem não saber lidar com a qualidade necessária”, ressalta. De acordo com ela, após a decisão do STJ, a argumentação do advogado é ainda mais essencial para ganhar o recurso de revisão. “O advogado tem que usar argumentos que o STJ não apreciou ainda ou apontar falhas no argumento do STJ”, explica.

Advogada orienta consumidores

Gerson Klaina
Clá,udia reforça cautela e advogado de confiança.

Sobre a promessa de redução de até 75%, Andressa Jarletti afirma que “tirando a capitalização, encargo de mora de 30% ao mês, revisando todos os valores, é possível conseguir redução substancial. Mas não existe matemágica”. Para quem quer tentar a revisão de valores, a advogada orienta solicitar cópia do contrato no banco – caso a instituição se recuse a fornecer, basta pedir ao Banco Central; e procurar um escritório de advocacia ou advogado. Ela alerta ainda que, ao entrar com o recurso, se o consumidor puder continuar pagando a parcela ao banco que faça, ao invés de pagar o valor reduzido em juízo. “Isso porque o banco tem o direito de cobrar, e pode gerar busca e apreensão. Caso a ação seja ganha, o valor será devolvido com correção monetária e juros de mora”, destaca.

Outra dica da especialista em direitos ao consumidor é a portabilidade bancária. “É possível transferir as operações de um banco para outro. Jogando para o banco com taxas menores já é possível a redução de valores e não demora o tempo que leva na Justiça”, sugere.

Juros

A coordenadora do Procon-PR, Cláudia Silvano, reforça que é preciso muita cautela para a contratação de serviço de revisão de contratos. Ela destaca ainda que nem sempre parcela alta significa que o consumidor está pagando juros abusivos. “Juro abusivo é apenas quando estão cobrando quantia em desacordo com o mercado em determinado período. Aí sim é possível pedir essa revisão”, aponta. Ela orienta a quem queira entrar com esse processo que “procure o advogado de confiança, que não seja um aventureiro e não faça promessas milagrosas, porque não existe milagre”.

Incômodo após ganho de causa

Nem sempre ganhar ação judicial é o fim dos problemas. A aposentada Silvia Lima teve o carro, adquirido por sistema de leasing, apreendido há cerca de cinco anos. Ela entrou na Justiça e, no ano passado, ganhou a causa e recebeu as parcelas que tinha pago. Mas o incômodo continuou. “A assessoria que faz a cobrança do banco fica mandando e-mail para cobrar três mil e poucos reais. Recebo quatro, cinco e-mails todos os dias”, conta Silvia. A aposentada teve ainda problemas para conseguir crédito em outra instituição bancária. “Tentei fazer cartão de crédito, cheque especial, e não consegui. Tentei fazer cadastro em algumas lojas e também não deu. Tenho certeza que tem uma lista negra”, relata.