Corridas perdidas

Prefeitura de Curitiba atende taxistas e vai reforçar fiscalização de transporte irregular

Mudanças com pouco efeito prático. Esta é a percepção de taxistas em relação ao decreto municipal 947/2017, assinado pelo prefeito Rafael Greca (PMN) na semana passada, que prevê algumas alterações nos serviços de táxi. Segundo a prefeitura, as melhorias atendem reivindicações de entidades de classe da categoria. “São medidas ao nosso alcance para dar mais competitividade e qualidade a um serviço que é oficial da cidade, ajudando a fazer frente aos meios alternativos de transporte privado que surgiram nesses últimos anos”, justificou Greca, que havia prometido durante a campanha eleitoral conciliar táxi e aplicativos.

Mas, para os taxistas, as novidades não melhoram a concorrência com Uber e Cabify. Ontem, após carreata e reunião com representantes da administração municipal, a prefeitura prometeu reforçar a fiscalização do transporte irregular de passageiros e anunciou uma campanha publicitária para incentivar o uso de táxis – o que deixou os profissionais dos carros laranjas e pretos mais satisfeitos.

A partir de agora, a taxa de excedente de bagagem não pode mais ser cobrada. O valor da tarifa era de R$ 2,70 por passageiro que levasse mais de uma mala. A decisão de cobrar ou não o valor era do taxista, mas para garantir que não haja mais essa possibilidade, a Urbs decretou o fim da taxa. Nas ruas, os taxistas afirmam que esta tarifa não estava sendo cobrada. “Foi só um meio de eles falarem que fizeram alguma coisa, mas na verdade não fizeram nada porque os passageiros sabem que não era cobrado isso daí”, desabafa o taxista Paulo Roberto Silva, 36 anos. O taxista Aguinaldo de Oliveira, 50, concorda com a nova lei. “Achei bom, o táxi está muito caro. Chama mais cliente”, afirma.

Bandeirada inicial

Outra mudança é em relação à taxa inicial da corrida. O valor da bandeirada só passar a contar no momento do embarque do passageiro. Antes os táxis podiam ligar o taxímetro, que registra e calcula o valor da corrida, desde o ponto de origem do motorista até o local de embarque do passageiro. Segundo Lucas Santos Rossi, 22, a maioria dos taxistas chegava com o taxímetro desligado. “É muito antigo, de uns tempos pra cá, que eu saiba, ninguém estava chegando com ele ligado”, diz.

Na avaliação do Sindicato dos Taxistas do Estado do Paraná (SindiTaxi/PR), a lei não muda nada. “Os taxistas já não cobravam, mas agora obriga 100% da frota a cumprir”, afirma o presidente da entidade, Abimael Mardegan. “Geralmente os táxis que eu peço já chegavam [com o taxímetro] desligado. Não vai mudar muito, mas pelo menos acaba com o abuso”, opina a bancária Magna Pereira, 47.

Se o passageiro perceber que o taxímetro estava ligado, ou que a taxa de bagagem foi cobrada, deve denunciar pelo 156 ou diretamente na Urbs. O órgão recomenda que o usuário anote o número do táxi (que está na porta ou no painel do carro) ou peça o recibo da corrida, pois essa é garantia que dará condições de punição ao taxista.

Taxa de retorno atrapalha

A taxa de retorno de 30% para viagens fora do município de origem continua sendo cobrada. De acordo com a Urbs, a cobrança é opcional, e consta em lei municipal para compensar o retorno sem passageiro, pois um taxista de Curitiba não pode transportar usuário de outro município. O objetivo é que o taxista não “invada” a área de outro. Segundo o SindiTaxi-PR, é um acordo de cavalheiros. “Isso já está em pauta para que seja extinto. É um benefício dado ao taxista porque ele tem que voltar com o carro vazio”, explica Abimael Margegan.

Para os taxistas, essa tarifa afasta os passageiros. “Eu acho que atrapalha sim, se tirasse a taxa de retorno aumentava o serviço”, diz Claudio Luís de Souza, 50. O colega de profissão Paulo Roberto Silva, 50, concorda. “Esses 30% está espantando o passageiro do táxi, estamos ficando sem serviço”, relata. A equipe dos Caçadores de Notícias ficou cerca de 30 minutos no ponto de táxi da Praça Carlos Gomes para conseguir entrevistar uma passageira, o que mostra a baixa procura pelo serviço.

Taxistas ficaram satisfeitos com resultado do protesto. Foto: Átila Alberti
Taxistas ficaram satisfeitos com resultado do protesto. Foto: Átila Alberti

Carreata contra aplicativos

Na tarde de ontem, um grande número de taxistas saiu em carreata da sede do SindiTaxi, no Prado Velho; passou pela Rodoferroviária, onde fica a sede da Urbs; e se dirigiu até a prefeitura, no Centro Cívico, para cobrar uma posição do prefeito Rafael Greca sobre a fiscalização das empresas de transporte privado. “Cobramos a omissão do município em alertar a população sobre usar um transporte que não é regulamentado. Se não tem lei, o Uber continua sendo pirata e irregular”, afirma o presidente do SindiTaxi-PR, Abimael Mardegan. Segundo ele, em Curitiba 3 mil táxis concorrem com cerca de 7 mil motoristas que prestam serviços para a Uber. “Curitiba é vista como cidade modelo, e hoje está sendo vista como a cidade da pirataria”, define.

De acordo com João de Souza, taxista há 19 anos, é a primeira vez que a classe sofre queda de 50% nos rendimentos. “Empresas irregulares que não pagam os mesmos impostos e taxas que nós pagamos estão levando nossos clientes”, lamenta. “Eu estou vendendo até meu apartamento porque as viagens caíram demais e não estou conseguindo pagar”, revela o taxista Fábio Avello, há quatro anos na atividade. Felipe Timóteo, 20, também aderiu à manifestação. “Estou há um ano no táxi e só peguei a época difícil. Então, tenho que lutar pela categoria e também pela segurança dos passageiros”, pontua.

Taxistas alegam perda de movimento com concorrência de Uber e Cabify. Foto: Felipe Rosa
Taxistas alegam perda de movimento com concorrência de Uber e Cabify. Foto: Felipe Rosa

Mais fiscalização

Representantes dos taxistas foram recebidos pelo presidente da Urbanização de Curitiba (Urbs), José Antonio Andreguetto, pelo chefe de gabinete do prefeito, João Alfredo Costa Filho, secretários de governo e Defesa Social e Trânsito. A Urbs se comprometeu a intensificar as ações de fiscalização do transporte irregular de passageiros, em parceria com a Setran. “Além disso, a Prefeitura de Curitiba deu início hoje (ontem) a uma campanha publicitária que incentiva o uso do táxi. O material está sendo colocado em 700 pontos do mobiliário urbano da cidade”, informou a prefeitura.

Para Abimael, a reunião foi muito proveitosa. “Eles afirmaram que vão nos ajudar porque somos regulamentados. Por isso, aumentarão as blitze nas ruas para garantir mais fiscalização e multar quem estiver realizando o transporte de passageiros irregular”, afirmou. Segundo ele, a ação deve começar já na próxima semana. “Mas se nada for feito, vamos voltar à prefeitura”, prometeu. (Colaborou Ana Tereza Motta)

É concorrência desleal?

Magna defende livre concorrência. Foto: Felipe Rosa
Magna defende livre concorrência. Foto: Felipe Rosa

Os taxistas não acham justa a concorrência com os aplicativos, como Uber e Cabify. “O Uber é irregular. Deveria aumentar a frota de táxi, em mil carros, e baixar o valor da bandeirada e fazer mais propaganda pro táxi”, comenta o taxista Paulo Roberto Silva, 36. “Eles tinham que tirar esses carros que estão trabalhando irregular e atrapalhando o serviço da gente”, opina Claudio Luís de Souza.

A bancária Magna Pereira, entrevistada ao descer de um táxi, é a favor dos dois serviços. “Tem que ter livre concorrência entre o Uber e o táxi. O que deveria acabar são as taxas abusivas da Urbs sobre os taxistas, isso que é um absurdo, não tem como o taxista não ter concorrência com o Uber” diz a bancária Magna Pereira. Hoje os taxistas pagam duas taxas anuais à Urbs: outorga, que é a concessão do direito do serviço, no valor de R$ 1.350 – que pode ser parcelado em 4 vezes; e a gerencial, de R$ 162. Além disso, os profissionais vinculados a radiotáxis pagam um valor mensal às centrais, que varia de R$ 800 a R$ 1 mil.

Regulamentação “empacada”

Tanto Uber como Cabify defendem a regulamentação dos aplicativos, mas alegam que podem funcionar amparados pelo Plano Nacional de Mobilidade Urbana, que estabelece a prestação de serviços particulares de transporte. Para especialistas ouvidos pela Tribuna, apesar da falta de normatização, a operação dos aplicativos não é considerada irregular.

Na Câmara Municipal de Curitiba, foi protocolado no último dia 5 de abril um projeto de lei assinado por seis vereadores para disciplinar o funcionamento de serviços de transporte privado individual. A proposta é que os motoristas de aplicativos estejam sujeitos a tributos e encargos administrativos, além de registro no órgão municipal competente, que hoje é a Urbs. A matéria aguarda análise da Procuradoria Jurídica antes de seguir para as comissões especiais.