Curitiba

Falta de respeito

Escrito por Ricardo Pereira

As mudanças no projeto das 10 Medidas Contra a Corrupção pegaram a população de surpresa. Com uma votação que avançou pela madrugada de ontem, depois de sete horas de sessão, a nova proposta, que ainda não foi completamente absorvida pelo povo, provoca revolta.

Aloísio
Aloísio: Estamos desacreditados.

Dos itens originais, apenas dois foram mantidos sem mudanças: a criminalização do caixa dois e a exigência para que tribunais de Justiça e Ministério Público reforcem atos de transparência, divulgando informações sobre tempo de tramitação de processos e que as razões, em caso de demoras, sejam identificadas. Entre outros pontos, os deputados derrubaram a criminalização do enriquecimento ilícito, o aumento do tempo de prescrição e acabaram com a figura do “reportante do bem” – que recebe recompensa pela denúncia de irregularidades.

Maria: Não é correto fazer isso, legislar em causa própria.
Maria: Não é correto fazer isso, legislar em causa própria.

Nas ruas, o sentimento era de indignação com a classe política. O corretor de seguros Aluísio Cordeiro da Rocha considera que os parlamentares atuam sempre em causa própria. “Foi uma discussão pública, milhões de brasileiros apoiando a proposta e tudo isso indo por água abaixo. O país está perdido. É uma falta de respeito com o povo. Precisamos melhorar a Constituição e votar em bons políticos. Estamos desacreditados”, desabafa.

Para o funcionário público Tiago dos Santos, não é novidade que o Congresso atue contra a vontade pública. “Sempre foi e sempre será assim, infelizmente. Lá eles só aprovam o que os beneficia. Quando é interesse do povo as coisas não são assim. Se é benefício para eles, é tudo muito rápido e do jeito que fica melhor para a categoria”, explica.

A principal novidade foi a inserção da possibilidade de crime de abuso para promotores, juízes e entes da lei – o que foi considerado pela força-tarefa da Lava Jato como uma tentativa de paralisar a operação. “Eles querem calar a boca do Poder Judiciário, dizendo que agora ele não vê e também não fala”, diz Tiago.

Falcatrua descarada

A estudante de Medicina Veterinária, Ana Paula, considera um dos pontos mais graves o fato de a votação ter sido concluída na madrugada. “É um desrespeito, foi em um momento em que as pessoas não aguardavam tal coisa. Isso é uma afronta”, alega.

Tiago: Lá eles só aprovam o que os beneficia.
Renan: É uma falcatrua descarada da parte deles.

A costureira Maria Kosechen concorda. “Mudaram coisas demais. Acaba que, no fim das contas, ficou muito melhor para eles [os políticos]. Não é correto fazer isso, legislar em causa própria. Ainda mais assim, repentinamente”.

Tiago: Lá eles só aprovam o que os beneficia.
Tiago: Lá eles só aprovam o que os beneficia.

Já para o estudante de Direito, Renan Freitas, as mudanças são uma tentativa de intimidação. “É uma falcatrua descarada da parte deles. Como têm coragem de mudar tudo isso que está resolvendo o país? A Justiça tem conseguido resolver esses problemas e quando começa a andar eles tentam barrar”, diz.

A corretora de seguros Caroline Campos acredita que a movimentação dos deputados tem objetivos ainda não esclarecidos. “É para proteger alguém. O que está aparecendo é só a ponta do iceberg. Acredito que tenham muitos outros problemas e atos de corrupção que ainda não vieram à tona”, afirma.

Voz do povo ignorada

Ana acha grave o fato de a votação ter sido concluída na madrugada.
Ana acha grave o fato de a votação ter sido concluída na madrugada.

Para o professor de Direito Constitucional da Universidade Positivo, Eduardo Faria Silva, alguns itens representam a tentativa de silenciamento do Poder Judiciário e do Ministério Público. “Tudo isso demonstra que há um embate entre Poder Executivo, Legislativo e Judiciário. Há uma descaracterização do projeto de lei protocolado. Se for aprovado como está, não terá eficácia no combate à corrupção”, antecipa. Para o especialista, o impasse deve ser resolvido no Supremo Tribunal Federal. “Com certeza vai haver questionamento. Entre os que aprovaram o texto atual, percebe-se que há uma intenção de autopreservação, desconsiderando a voz do povo”, afirma.

Tem protesto domingo!

Pela internet, grupos organizam protestos para o próximo domingo (4/12). Em Curitiba, o ato do movimento Vem Pra Rua está programado para acontecer a partir das 15h na praça em frente ao prédio da Justiça Federal, no bairro Ahú. As manifestações são de apoio à Lava Jato e ao Ministério Público Federal.

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Ricardo Pereira

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